Lucielly Melo
A juíza Ana Cristina Mendes, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, rejeitou a denúncia oriunda da Operação Cartas Marcadas em relação ao procurador do Estado, Dorgival Veras de Carvalho. Isso porque a magistrada não encontrou provas da participação dele no esquema de emissão de cartas de crédito fraudulentas, que gerou um rombo de R$ 418 milhões aos cofres públicos.
A decisão é do último dia 26 e atendeu ao pedido da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB-MT), que atua como assistente da defesa de Dorgival.
Segundo a denúncia, Dorgival teria emitido pareceres sobre a legalidade das cartas de crédito, o que teria efetivado os desvios de dinheiro público.
Nos autos, a entidade sustentou que não há justa causa para que o processo seguisse seu trâmite em relação ao procurador. Para embasar o argumento, a OAB citou um acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) que isentou os procuradores Dilmar Portilho Meira, Gerson Valério Pouso, Nelson Pereira dos Santos e Jenz Prochnow Júnior no caso.
O Ministério Público se posicionou contra o pedido. De acordo com o órgão, a responsabilidade criminal deve ser apurada de forma individual e que o TJ apenas analisou a situação dos outros suspeitos e não de Dorgival.
Alegou, ainda, que a Justiça já havia recebido a denúncia contra o referido procurador em 2016, “não havendo qualquer questionamento da parte a tempo, e, portanto, operou-se a preclusão dessa fase processual, não cabendo a reconsideração da decisão de recebimento de denúncia em um segundo juízo de admissibilidade da exordial acusatória”.
Na decisão, a magistrada citou o entendimento do desembargador Orlando Perri, responsável por relatar o caso no TJMT. Ele não viu indícios mínimos de que os procuradores estavam cientes das fraudes e que a denúncia “teria sido alicerçada em meras especulações, presunções, ilações e conjecturas, de que eles teriam aderido à vontade dos demais agentes”.
A magistrada concordou. Para Ana Cristina, apesar de o órgão ministerial ter pugnado pela impossibilidade da reconsideração da decisão que recebeu a denúncia, cabe ao Juízo cessar o prosseguimento da ação penal, quando identificar requisitos que levem à rejeição do procedimento.
“Neste diapasão, constatada a hipótese de que a Ação Penal teria evoluído sem justa causa para a sua instauração, cujos argumentos eventualmente possam ter se originado da defesa do acusado, não deve o Juízo ficar adstrito à decisão de recebimento da denúncia, e promover a tramitação de uma Ação fadada ao insucesso. Registro que a denominação de sucesso, neste contexto, não é relacionada à condenação do acusado, mas sim ao alcance da verdade dos fatos, independente se dela decorrer a condenação ou absolvição do agente”, explicou a juíza.
Desta forma, ela também concluiu que não há material probatório da atuação de Dorgival no enredo ilícito.
“Embora a narrativa apresentada na denúncia tenha certa lógica, em análise efetuada num espectro amplo, visto que os atos aparentam concatenação no contexto da cadeia criminosa, contudo, ao se dar enfoque na ação individualizada dos agentes, não é possível extrair dos autos elementos probatórios que dão sustentação mínima à imputação delitiva a justificar a instauração da Ação Penal em face de Dorgival Veras de Carvalho”.
“Se em face dos demais acusados existem elementos angariados por meio de busca e apreensão, quebra de sigilo bancário, quebra de sigilo telefônico que dão sustentação ao processamento da Ação Penal, especificadamente em face deste acusado, não é possível extrair qualquer elemento que indique o dolo em sua conduta, de modo que nos levaria ao entendimento de que fora denunciado amparado em “lógica”, o que não teria respaldo para tanto”, prosseguiu.
“Portanto, em harmonia com o pronunciamento na Ação Penal originária, incabível a instauração da Ação Penal em face de Dorgival Veras de Carvalho, tendo como sustentação indiciária contra ele, apenas a nomeação de comissão e homologação de parecer, não sendo suficientes para demonstrar o dolo na conduta e, tampouco, que o ato fora praticado em anuência e com propósito delitivo”, finalizou a juíza ao rejeitar a denúncia em relação ao procurador.
Entenda mais sobre o caso
O caso das cartas de crédito foi objeto de investigação que originou Operação Cartas Marcadas, que investigou possíveis danos aos cofres públicos, com o esquema fraudulento na emissão de certidões de crédito de cunho salarial, envolvendo órgãos da Administração Pública Estadual e o Sindicato dos Agentes de Administração Fazendária.
Conforme o MPE, a ação supostamente criminosa resultou na falsificação de papéis de créditos públicos no valor de R$ 665.168.521,99, com violação do Acordo Extrajudicial e à Lei nº 9049/2008 vigente à época dos fatos. O valor desviado de receita pública girou em torno de R$ 418 milhões.
Foram acusados de participação: Gilmar Donizete Fabris, João Vicente Picorelli, Ocimar Carneiro de Campos, Enelson Alessandro Nonato, Rogério Silveira, Anglisey Battini Volcov, Éder de Moraes Dias, Dorgival Veras de Carvalho, Dilmar Portilho Meira, Gerson Valério Pouso, José Constantino Chocair Júnior e Estado de Mato Grosso.
LEIA ABAIXO A DECISÃO NA ÍNTEGRA: