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Cuiabá, 24 de Novembro de 2025

Opinião Segunda-feira, 24 de Novembro de 2025, 09:49 - A | A

Segunda-feira, 24 de Novembro de 2025, 09h:49 - A | A

ADRIANE DO NASCIMENTO, JACKSON RIKBAKTA E VICTOR LUIZ

Suspensão de falência da Oi

Um caso de liquidação ordenada e governança corporativa

A suspensão da falência da Oi, determinada pela Desembargadora Mônica Maris Costa, poucos dias após a sentença de quebra, recolocou o grupo sob o regime de recuperação judicial e restabeleceu a eficácia do plano aprovado pelos credores em 2024. A decisão partiu de premissas jurídicas clássicas, mas aplicadas a uma situação de elevada sensibilidade regulatória: a preservação da função social, a continuidade de serviços essenciais e a necessidade de assegurar coerência institucional ao processo de reorganização. O efeito imediato foi reabrir o espaço de negociação e impedir que uma liquidação abrupta desencadeasse distorções no mercado de telecomunicações e riscos à coletividade usuária.

A crise, contudo, não surgiu de improviso. O pedido de recuperação apresentado em 2016 revelou um passivo superior a R$ 65 bilhões, acumulado a partir de uma estratégia de expansão desconectada da capacidade operacional e financeira da companhia. A ausência de integração após aquisições, somada à alavancagem excessiva, formou um desequilíbrio estrutural que, desde então, orienta o contorno jurídico do caso. A Oi converteu-se em um observatório privilegiado de como decisões empresariais mal calibradas repercutem em setores submetidos a rígido escrutínio regulatório.

Ao longo da recuperação, a empresa vendeu seus principais ativos: a operação móvel, transferida ao consórcio formado por Claro, TIM e Vivo, e a rede de fibra óptica, que passou ao controle da V.tal. Essas alienações, embora relevantes para gerar liquidez, não reconstituíram a vitalidade econômica da companhia. Em 2025, o fluxo de caixa continuava deficitário e havia uma dívida residual de aproximadamente R$ 1,7 bilhão. Restou uma estrutura esvaziada, ainda responsável por obrigações perante consumidores e reguladores, mas com capacidade financeira reduzida para cumpri-las.

Foi nesse cenário que, em 10 de novembro de 2025, a 7ª Vara Empresarial decretou a falência da Oi. A sentença identificou sinais de esgotamento da reorganização, mencionou a existência de uma “liquidação sistêmica” decorrente da alienação sucessiva de ativos e determinou o afastamento da administração diante de indícios de falhas de governança. A leitura judicial foi a de que a empresa já não reunia condições para prosseguir no regime de recuperação.

A decisão, porém, foi suspensa alguns dias depois pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que acolheu recurso do Banco Bradesco. Na fundamentação, destacou-se que a falência imediata poderia comprometer a continuidade de serviços vinculados ao interesse público e gerar impactos sociais e econômicos desproporcionais. Sob essa ótica, a recuperação judicial oferece um ambiente mais controlado para a alienação organizada dos ativos remanescentes, com fiscalização do juízo, do Ministério Público e da administração judicial.

O Tribunal também registrou que parte relevante do descumprimento do plano decorreu da inércia da administração da companhia, que não adotou as medidas necessárias para captar os recursos previstos em cláusulas específicas do plano de 2024. A liberdade de condução empresarial, observou-se, não pode servir de escudo quando produz prejuízos diretos ao processo de soerguimento e aos credores.

A trajetória da Oi expõe, com rara nitidez, a necessidade de aperfeiçoamento dos instrumentos de insolvência no Brasil, especialmente para setores cuja atividade repercute imediatamente sobre direitos fundamentais e sobre a ordem econômica. O caso demonstra que a alienação de ativos, ainda que extensa, não substitui uma reorganização funcional da empresa. Evidencia, também, que a qualidade da governança corporativa — e não apenas a engenharia financeira — condiciona o êxito de um processo de revitalização.

A experiência acumulada revela que reestruturações dessa magnitude exigem mais que renegociações de dívida. Reclamam uma arquitetura de gestão capaz de avaliar riscos com precisão, assegurar transparência decisória e manter alinhamento entre interesses privados e o interesse público subjacente à prestação de serviços essenciais. A situação da Oi, nesse sentido, permanece como um exemplo de como escolhas empresariais e respostas jurídicas interagem em cenários de alta complexidade, e de como a ausência de mecanismos robustos de controle e planejamento pode prolongar crises que deveriam ter sido resolvidas anos antes.

Autores

Adriane A. Barbosa do Nascimento é advogada, Doutoranda em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), Instituição pela qual também é Mestra em Economia, Políticas Públicas e Desenvolvimento. É especialista em Direito Tributário, Direito Societário e Direito do Trabalho, além de Economista registrada no CORECON-MT (n.º 00001/ME). Atua como Sócia-Administradora da Sociedade de Advocacia Simões Santos, Nascimento & Associados, em Cáceres/MT, e como Diretora Executiva da Consultoria Empresarial e Econômica Simões Santos, Nascimento & Almeida, em Cuiabá/MT. Coordena projetos de planejamento e gestão estratégica patrimonial, negócios corporativos e assessoria jurídico-econômica. Entre 2022 e 2024, integrou a Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB como Consultora, contribuindo para análises técnicas e para o aperfeiçoamento de políticas e normas tributárias. Prêmio Brasil de Economia - 3º lugar na edição de 2024, na categoria Artigo Temático; e 1º lugar na edição de 2023, na categoria Artigo Técnico-Científico.

Jackson Wakzemy Rikbakta, Advogado no Escritório Simões Santos, Nascimento & Associados Sociedade de Advocacia, Pós-graduando em Direito do Agronegócio pela ESA/MT e UFMT. Pós-graduando em Planejamento e Recuperação de Creditos Tributário pela Instituição Legal Educacional. Secretário-Geral da Comissão de Direito Tributário da OAB Cáceres – MT.

Victor Luiz M. de Almeida, advogado associado no escritório Simões Santos, Nascimento e Associados, Pós-graduado em Direito e Compliance Trabalhista pelo Instituto de Estudos Previdenciários – IEPREV, Pós-graduando em Direito do Agronegócio pela ESA/MT com a UFMT, Juiz Relator do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/MT.

REFERÊNCIAS:

COLAÇO Janize; SANTOS Micaela. Após pressão de credores, Justiça suspende falência da Oi e empresa volta para recuperação judicial. G1, 14 de outubro de 2025. Disponível em:<https://g1.globo.com/economia/noticia/2025/11/14/justica-suspende-falencia-da-oi.ghtml>. Acesso em: 18 de novembro de 2025.

JULIÃO, Henrique. Justiça suspende falência da Oi e retoma recuperação judicial. Teltine, 14 de novembro de 2025. Disponível em:< https://teletime.com.br/14/11/2025/justica-suspende-falencia-da-oi-e-retoma-recuperacao-judicial/>. Acesso em: 18 de novembro de 2025.

MORI, Letícia. Justiça decreta falência da Oi depois de quase dez anos de recuperação judicial. Jota, 10 de novembro de 2025. Disponível em:< https://www.jota.info/tributos-e-empresas/mercado/justica-decreta-falencia-da-oi-depois-de-quase-dez-anos-de-recuperacao-judicial>. Acesso em: 17 de novembro de 2025.

ROSA, Bruno. De volta a recuperação judicial, OI corre para gerar caixa. O Globo, 15 de novembro de 2025. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/economia/negocios/noticia/2025/11/15/de-volta-a-recuperacao-judicial-oi-corre-para-gerar-caixa.ghtml>. Acesso em: 18 de novembro de 2025.