A crise econômica iniciada no Brasil em 2015 produziu efeitos profundos sobre o agronegócio, setor que, apesar de sua relevância estrutural para a economia nacional, não esteve imune às sucessivas instabilidades macroeconômicas. A esse cenário somaram-se a crise financeira de 2018, os impactos sistêmicos da pandemia da Covid-19 e, mais recentemente, as tensões geopolíticas e a volatilidade dos mercados internacionais, fatores que pressionaram custos, afetaram cadeias produtivas e restringiram o crédito rural.
Embora o agronegócio responda por parcela expressiva do Produto Interno Bruto brasileiro e apresente elevada capacidade produtiva, observa-se um aumento significativo do endividamento de produtores rurais, especialmente daqueles que exercem a atividade de forma individual ou familiar. A evolução da jurisprudência passou a reconhecer o produtor rural como sujeito apto à recuperação judicial, instrumento juridicamente legítimo e, em determinadas hipóteses, indispensável à preservação da atividade econômica.
Não se trata, contudo, de questionar o modelo da recuperação judicial em si, mas de refletir sobre sua aplicação prática. A recuperação judicial não deve ser compreendida como resposta automática às dificuldades financeiras do produtor rural, sobretudo diante de seus custos elevados, de sua complexidade procedimental e dos riscos inerentes à sua condução quando desacompanhada de análise prévia de viabilidade econômica e de ajustes estruturais no modelo de gestão e produção.
A experiência recente evidencia que pedidos formulados de maneira indiscriminada, sem o necessário balizamento técnico e sem a efetiva readequação da atividade econômica, acabam por reproduzir as mesmas práticas que conduziram à crise. Esse movimento gera desconfiança no sistema financeiro, compromete a credibilidade do setor e produz reflexos diretos no encarecimento e na restrição do crédito rural, com impactos negativos sobre a própria produção agrícola.
Nesse contexto, impõe-se a adoção de estratégias mais racionais e eficientes de reestruturação do produtor rural, capazes de preservar a confiança do mercado e do sistema financeiro. Mecanismos como renegociações extrajudiciais estruturadas, revisão contratual, alongamento responsável de passivos, reorganização financeira e profissionalização da gestão mostram-se, em muitos casos, juridicamente adequados e economicamente mais eficazes.
A modernização que transformou a produção agrícola brasileira deve avançar também sobre a gestão e a estrutura financeira do produtor rural. Processos de reestruturação conduzidos com planejamento, transparência e ajustes reais reforçam a capacidade de geração de renda e de adimplemento, permitindo que o mercado volte a enxergar a atividade agrícola com previsibilidade e confiança, condição indispensável para a sustentabilidade do crédito e para a preservação do agronegócio como vetor central da economia nacional.
Artur Malheiros Porém é advogado.







