A Lei nº 14.133/2021 ou Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLC) entrou em vigor em 01/04/2021. Dentre as inúmeras novidades, destaca-se o regramento inerente à atuação dos (as) advogados (as) públicos.
De acordo com o art. 10 “Se as autoridades competentes e os servidores públicos que tiverem participado dos procedimentos relacionados às licitações e aos contratos de que trata esta Lei precisarem defender-se nas esferas administrativa, controladora ou judicial em razão de ato praticado com estrita observância de orientação constante em parecer jurídico elaborado na forma do § 1º do art. 53 desta Lei, a advocacia pública promoverá, a critério do agente público, sua representação judicial ou extrajudicial”.
Assim, é direito dos agentes públicos (autoridades competentes e servidores públicos) que tiverem participado dos procedimentos relacionados às licitações e aos contratos serem defendidos pelos (as) advogados (as) públicos.
A defesa abrange as esferas administrativa, controladora e judicial, bem como inclui hipótese de o agente público não mais ocupar o cargo, emprego ou função em que foi praticado o ato questionado. A atuação da advocacia pública está condicionada ao seguimento, pelos agentes públicos, da “estrita observância de orientação constante em parecer jurídico” e depende da vontade do agente público em ser defendido pelos (as) advogados (as) públicos. É dizer o agente público pode optar por ser defendido pela advocacia pública desde que tenha praticado ato com estrita observância na orientação jurídica; mas pode preferir ser patrocinado por advogado particular.
Outro ponto a ser destacado é que o parecer jurídico que orientou a prática do ato, pelo agente público, é aquele mencionado no art. 53, § 1º: “Ao final da fase preparatória, o processo licitatório seguirá para o órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação.”
Essas são as regras gerais de aplicação do art. 10. Apesar de ainda ser cedo para emitir opiniões conclusivas sobre a nova lei, já é possível “especular” alguns aspectos e tecer breves comentários sobre o tema. Aparentemente, o parecer mencionado no §1º do art. 53 não vincula o agente público. Afinal, ele pode optar por não seguir a orientação e abrir mão do direito de ser defendido pelos integrantes da advocacia pública.
Apesar disso, é provável que, na prática, a tendência seja que os pareceres sejam seguidos com mais frequência, afinal, agir de acordo com as recomendações jurídicas permite ao servidor público responsável ser defendido pelo (as) advogados (as) públicos.
Além disso, convém destacar que o parecer abrange todo o procedimento, não apenas as minutas dos editais e contratos conforme prevê o art. 38, parágrafo único da Lei 8.666/1993. Com o advento da Nova Lei de Licitações e Contratos, o órgão de assessoramento jurídico da Administração realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação como um todo.
Portanto, é correto afirmar que a responsabilidade dos (as) advogados (as) públicos sofreu significativa amplitude, na medida em que é de sua competência analisar mais atos (todo o processo) e poderão ter que atuar na defesa de mais pessoas (agentes públicos e a pessoa jurídica de direito público que apresentam).
Outra consequência desse dispositivo é que os órgãos de assessoramento e os demais órgãos dos entes públicos deverão estreitar o relacionamento entre si. A título de exemplo, oportuno citarmos o disposto no artigo 117, §3º, o qual estabelece o dever do órgão de assessoramento jurídico em dirimir dúvidas e subsidiar o fiscal do contrato com informações pertinentes à execução contratual.
Com efeito, espera-se que haja mais comunicação e interação entre os agentes públicos e os seus potenciais advogados (as). Isso contribuirá para a criação de soluções jurídicas e de uma gestão mais otimizada, completa e adequada, o que, em última análise, implicará em contratações mais eficientes.
Mas há alguns pontos que merecem uma reflexão mais detida. O primeiro ponto é em relação à constitucionalidade desse dispositivo (art. 10). Poderia a lei que trata de licitações e contratos atribuir aos (as) advogados (as) públicos a defesa de agentes públicos?
Outro questionamento é o seguinte: o disposto no art. 10 aplica-se aos Municípios que não possuem Advocacia Pública devidamente estruturada com servidores ocupantes de cargos efetivos? A discussão é importante porque a lei diz claramente que é a “advocacia pública” que defenderá o agente. Se sim – afinal, trata-se de um direito do agente público que segue a orientação emanada do parecer – como será feito o pagamento do (a) advogado (a) que assessora o Município, por exemplo?
E o valor do contrato será alterado para incluir a defesa do agente? Na hipótese de o (a) advogado (a) / empresa contratado (a) não concordar em defender o agente público, o que fazer? E se o contrato de assessoria jurídica já tiver sido extinto?
Outro questionamento que certamente será feito se refere ao § 1º, inciso II, do art. 10, segundo o qual “não se aplica o disposto no caput deste artigo quando provas da prática de atos ilícitos dolosos constarem nos autos do processo administrativo ou judicial.” Afinal, como os (as) advogados (as) poderão concluir se houve ou não ato ilícito doloso? Bastará alegar que foram praticados atos ilícitos dolosos? Como serão provados tais atos?
São reflexões que merecem nossa atenção e certamente serão objeto dos debates vindouros sobre a nova lei.
Rober Caio Martins Ribeiro e Daniel Zampieri Barion são advogados, procuradores do Município de Cuiabá e membros da União dos Procuradores do Município de Cuiabá (Uniproc).