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Cuiabá, 02 de Agosto de 2025

Legislativo Segunda-feira, 13 de Fevereiro de 2017, 11:46 - A | A

Segunda-feira, 13 de Fevereiro de 2017, 11h:46 - A | A

atraso entrega de imóvel

MRV é condenada a pagar R$ 26,5 mil a cliente por dano morais e materiais

A decisão é do juiz Yale Sabo Mendes e foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) desta segunda-feira (13)

Antonielle Costa

As empresas MRV Prime Chapada Guimarães Incorporações SPE Ltda., MRV Engenharia e Participações S/A e Prime Incorporações e Construções S/A foram condenadas a pagar R$ 26,5 mil a uma cliente, por atraso na entrega de uma imóvel.

A decisão é do juiz Yale Sabo Mendes e foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) desta segunda-feira (13).

Consta nos autos que a cliente firmou um contrato de compra e venda de imóvel “na planta”, com previsão de entrega para junho/2011, todavia não foi entregue no prazo, causando-lhe inúmeros transtornos e aborrecimentos.

Na contestação, as empresas alegaram a inaplicabilidade do código de defesa do consumidor e que não houve atraso na entrega do imóvel, posto que o prazo deve ser considerado a partir da assinatura do contrato de financiamento. Defendeu ainda a legalidade do prazo de tolerância de 180 dias para entrega do empreendimento.

No entanto, esse não foi o entendimento do magistrado.

“(...) Portanto, diante do atraso de praticamente 13 meses, devem as Requeridas serem responsabilizadas pelos prejuízos experimentados pela parte Autora. Os danos materiais, nos termos do artigo 402 do Código Civil, correspondem ao que o credor efetivamente perdeu (dano emergente) e o que razoavelmente deixou de lucrar (lucros cessantes)”, diz um trecho da decisão, que cabe recurso.

Leia abaixo a íntegra:

VISTOS

Trata-se de AÇÃO INDENIZATÓRIA que ROSELI ANGELITA GABIATTI, move em desfavor de MRV PRIME CHAPADA GUIMARAES INCORPORAÇÕES SPE LTDA, MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A e PRIME INCORPORAÇÕES E CONSTRUÇÕES S/A, alegando em síntese que firmou contrato de compra e venda de imóvel “na planta”, com previsão de entrega para JUNHO/2011, todavia a Requerida não entregou o bem na data pactuada, causando-lhe inúmeros transtornos e aborrecimentos. Ao final, requer a condenação das Requerida ao pagamento de indenização por danos materiais consubstanciado em danos emergentes decorrente dos prejuízos experimentados com o pagamento de aluguel nesse período, além de indenização por danos morais que alega ter experimentado de forma injusta.

As Requeridas apresentaram defesa as fls. 236/249, discorrendo acerca da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor e que não houve atraso na entrega do imóvel posto que o prazo deve ser considerado a partir da assinatura do contrato de financiamento. Defende ainda a legalidade do prazo de tolerância de 180 dias para entrega do empreendimento, e da legalidade da cláusula 5ª do contrato entabulado entre as partes. Requereu por fim, a improcedência do pedido de indenização por danos morais e materiais, uma vez que cumpriu todas as obrigações que lhe competia.

Réplica acostada as fls. 261/262.

Oportunizada às partes especificarem provas, propugnaram pelo julgamento antecipado da lide.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I do NCPC, pois versa sobre matéria de direito e de fato que gira em torno da indenização pelo atraso na entrega do imóvel.

De início, não custa observar que a partir da vigência do Novo Código Civil Brasileiro o julgador deve estar atento à função social e a não onerosidade dos contratos, de molde a estabelecer um equilíbrio entre as partes, mormente visando não prejudicar a parte mais frágil.

Igualmente, ao caso em apreço, aplicam-se as diretrizes traçadas pelo Código de Defesa do Consumidor, porquanto as partes amoldam-se perfeitamente aos conceitos de fornecedor de produtos/serviços e destinatário final daqueles, nos termos dos artigos 2º e 3º do referido Codex.

Nesse diapasão, impende registrar que o Código de Defesa do Consumidor, ao tratar da questão da responsabilidade por serviços prestados, apregoa consoante a norma inserta no seu artigo 14, caput, que o fornecedor responde independentemente da existência de culpa pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços.

Como decorrência da responsabilidade objetiva do prestador do serviço, para que ele possa se desonerar da obrigação de indenizar, deve provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou, a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (§ 3º, inc. I e II, do art. 14, do CDC).

Frise-se também que deve ser observada a necessidade de inversão do ônus da prova prevista no artigo 6º, inciso VIII do CDC, diante da hipossuficiência técnica e financeira do autor, bem como de sua vulnerabilidade.

No caso, as partes firmaram "Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de Bem Imóvel”, datado de 05/11/2009, ficando convencionado expressamente o prazo de entrega para “junho/2011”, ou “de acordo com a data de assinatura do contrato de financiamento junto à Caixa Econômica Federal” Prevalecerá como data de entrega de chaves, para quaisquer fins de direito, 18 (dezoito) meses após a assinatura do referido contrato junto ao agente financeiro.

Nesse ponto, assinalo que a cláusula que permite à ré a tolerância de 180 dias de prorrogação para entrega das obras, não é nula por si só, tratando-se de previsão plausível e de fácil compreensão, a uma por estar respaldada pelo artigo 48 da Lei nº. 4.591/1964, decorrente da natural probabilidade de possíveis intercorrências durante a execução da obra, e a duas porque também não enseja qualquer desequilíbrio contratual capaz de gerar ônus exacerbado em desfavor do adquirente, especialmente considerando ter ficado ciente dessa prorrogação ao assinar o contrato, e por ser praxe costumeira do mercado imobiliário exatamente este prazo de tolerância.

Oportuno reproduzir aqui, recentíssimo julgado da Colenda Corte quanto à inexistência de abusividade na respectiva cláusula:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 681.575 - MG (2015/0059581-0) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO AGRAVANTE : RENATO FURTADO DE AQUINO CUNHA AGRAVANTE : KEITTE ESTELA CUNHA DE AQUINO ADVOGADOS : ALEXANDRE BARROS TAVARES LUIS HENRIQUE FREITAS NOGUEIRA AGRAVADO : MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A ADVOGADOS : ANA CHRISTINA DE VASCONCELLOS MOREIRA FABIANO CAMPOS ZETTEL RAPHAELLA SENA BRUNO E OUTRO (S) DECISÃO 1. Cuida-se de agravo interposto por RENATO FURTADO DE AQUINO CUNHA e KEITTE ESTELA CUNHA DE AQUINO contra decisão que não admitiu o seu recurso especial, por sua vez manejado em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - PRIMEIRA APELAÇÃO NÃO RATIFICADA APÓS DECISÃO DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS - SÚMULA 418 DO STJ - NÃO CONHECIMENTO - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL - CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA - ABUSIVIDADE INEXISTENTE - INADIMPLEMENTO DA VENDEDORA - ATRASO NA ENTREGA DA OBRA - DANOS ORAIS - CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO - JUROS DE MORA - TERMO INICIAL. [...] - Inexiste abusividade na cláusula contratual que permite o atraso na entrega da unidade imobiliária pelo período de cento e oitenta (180) dias. - Na fixação da reparação por dano moral, incumbe ao julgador, ponderando as condições do ofensor, do ofendido, do bem jurídico lesado e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar o valor da indenização que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar enriquecimento sem causa da parte. - Tratando-se de responsabilidade civil decorrente de relação contratual, os juros de mora devem ser contados a partir da citação. (fl. 363) Opostos embargos de declaração, foram rejeitados. Nas razões do recurso especial, apontam os recorrentes ofensa ao disposto nos arts. 535 do Código de Processo Civil e 47 do Código de Defesa do Consumidor, 422 e 423, do Código Civil. Sustentam a existência omissão do acórdão recorrido, uma vez que não teria sido indicado de forma clara e precisa qual a situação imprevisível que ensejou a utilização da prorrogação do prazo de 180 (cento e oitenta) dias para entrega da unidade habitacional; aduzem que a permissão de prorrogação de uma obrigação sem prévia demonstração do motivo e da necessidade ofendeu o princípio da boa fé contratual. DECIDO. 2. A irresignação não prospera.[...] no tocante à previsão contratual da tolerância de 180 dias para entrega do imóvel, da mesma forma que entendeu o d. Julgador (f. 235), penso que não há que se falar em abusividade, pois, tal estipulação representa cláusula padrão os contratos da espécie, considerando que se trata de empreendimento complexo e sujeito a situações involuntárias das mais variadas, ditas de força maior, que podem levar ao atraso na entrega de unidades edilícias. (fl. 367) (...)4. Ante o exposto, nego provimento ao agravo. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 14 de abril de 2015. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO Relator (STJ - AREsp: 681575 MG 2015/0059581-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 17/04/2015)

Assim, diversamente do alegado pela parte Autora, verifico que ao assinar o contrato com o agente financeiro, o prazo anterior fixado na promessa de compra e venda deixa de prevalecer, pois substituído por outro lapso temporal, inclusive e novamente com sua anuência, onde restou estipulado o término da construção para 22 meses após a assinatura do contrato (30/06/2011-fl.40), o qual terminaria em ABRIL/2013.

Não se desconhece que para liberação do financiamento há inúmeras providências exigidas pelas instituições financeiras, de modo que qualquer irregularidade na documentação relativa ao imóvel ou dos compradores poderá atrasar a formalização da avença. Contudo, na hipótese vertente não foi trazido a baila os motivos que levaram o adquirente do imóvel somente assinar o contrato de financiamento quase 02 (dois) anos após a avença estabelecida com a vendedora, razão pela qual, conclui-se que ao não efetivar o pagamento do preço, seja com recursos próprios, seja com recursos obtidos com financiamento bancário, não poderia exigir da ré a entrega da unidade residencial adquirida, face ao que estabelece o artigo 476 do Código Civil.

Acrescento ainda, que o período de tolerância de 180 dias não se aplica também para a hipótese da escolha do financiamento, eis que, como analisado acima, o contrato é claro ao prever que a data de entrega seria em JUNHO/2011 (com possibilidade de tolerância de 180 dias) ou 18 meses contados a partir da assinatura do financiamento; não havendo que se misturar ambas as previsões apenas para favorecer a parte Requerida.

Assim, não obstante os argumentos declinados na inicial pelo Requerente com relação ao atraso na entrega do imóvel, diante da comprovação de tê-lo recebido em 26/05/2014, aliado ainda aos documentos relacionados a entrega das chaves do imóvel juntados as fls. 291/296, devidamente assinado pela parte Requerente identificam o cumprimento da obrigação da Requerida FORA do prazo avençado.

Portanto, diante do atraso de praticamente 13 meses, devem as Requeridas serem responsabilizadas pelos prejuízos experimentados pela parte Autora.

Os danos materiais, nos termos do artigo 402 do Código Civil, correspondem ao que o credor efetivamente perdeu (dano emergente) e o que razoavelmente deixou de lucrar (lucros cessantes).

No caso, pretende a parte Autora a indenização por danos emergentes, ou seja, a restituição do valor que pagou a título de locação de outro imóvel para sua moradia, partindo-se do pressuposto de que se o imóvel tivesse sido entregue no prazo contratual, esses valores não seriam desembolsados, os quais estão suficientemente demonstrados pelo contrato acostado às fls. 53/54.

Nesse ponto, consigno que a parte Requerida já efetuou o respectivo pagamento em cumprimento a decisão que antecipou os efeitos da tutela (fl.82/83).

No tocante ao pedido de indenização por danos morais, é assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido como residência é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. A respeito colaciono o seguinte precedente:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 612.704 - RJ (2014/0293364-7) RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO AGRAVANTE : CR2 CAMPINHO EMPREENDIMENTOS LTDA ADVOGADOS : GUSTAVO MAGALHÃES VIEIRA E OUTRO (S) DANIEL DE SOUZA VELLAME AGRAVADO : FERNANDO CHAME BARRETO ADVOGADO : JÚLIO FRANCISCO DE FARIAS E OUTRO (S) AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. UNIDADE IMOBILIÁRIA. ATRASO NA ENTREGA. CONFIGURAÇÃO DE DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO CONHECIDO PARA, DESDE LOGO, NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.

ANTE O EXPOSTO, diante da doutrina e da jurisprudência, e com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, para confirmar a tutela antecipada concedida as fls. 82/83 e CONDENAR as partes REQUERIDAS MRV PRIME CHAPADA GUIMARAES INCORPORAÇÕES SPE LTDA, MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A e PRIME INCORPORAÇÕES E CONSTRUÇÕES S/A, solidariamente, pagar à parte Requerente ROSELI ANGELITA GABIATTI:

1) R$ 20.000,00 (vinte mil reais), acrescido de juros legais de 1% ao mês a partir da citação (art. 240 CPC c/c 405 C.C) e correção monetária (INPC) a partir deste decisum (Sumula 362 STJ); a título de danos morais;

2) R$ 6.500,00 (seis mil e quinhentos reais), a título de danos emergentes, no valor correspondente ao aluguel do imóvel locado, multiplicado pelo número de meses correspondente ao tempo de atraso na entrega da unidade (13 x R$500,00), acrescido de juros de 1% ao mês e correção monetária (INPC) a partir do desembolso, subtraindo do cálculo os valores depositados em cumprimento da decisão de fls. 82/83.

CONDENO ainda, a parte Requerida, ao pagamento das custas do processo e honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do montante da condenação, de acordo com a orientação contida no parágrafo 2º do art. 85 do CPC.

P. R. I. Cumpra-se.

Cuiabá, 09 de fevereiro de 2017.

YALE SABO MENDES

Juiz de Direito