Um decreto prisional baseado em elementos concretos não pode ser revogado durante o plantão judiciário, já que o deferimento de liminar nesses casos constitui medida excepcional por sua própria natureza.
O entendimento é do desembargador Pedro Sakamoto ao indeferir o pedido de liberdade impetrado pelo advogado Artur Barros Freitas Osti, em favor do ex-servidor da Secretaria de Estado de Educação, Fábio Frigeri.
Ele foi preso no último dia 3, durante a "Operação Rêmora", deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), para desmantelar uma organização criminosa que atuava em licitações e contratos administrativos de obras públicas de construção e reforma de escolas da Secretaria de Estado de Educação (Seduc).
De acordo com as investigações do Gaeco, a organização criminosa é composta por três núcleos, de agentes públicos, de operações e empresários.
O núcleo de operações, após receber informações privilegiadas das licitações públicas para construções e reformas de escolas públicas estaduais, organizou reuniões para prejudicar a livre concorrência das licitações, distribuindo as respectivas obras para 23 empresas, que integram o núcleo de empresários.
Por sua vez, o núcleo dos agentes públicos era responsável por repassar as informações privilegiadas das obras que iriam ocorrer e também garantir que as fraudes nos processos licitatórios fossem exitosas, além de terem acesso e controlar os recebimentos dos empreiteiros para garantir o pagamento da propina.
Já o núcleo de empresários, que se originou da evolução de um cartel formado pelas empresas do ramo da construção civil, se caracterizava pela organização e coesão de seus membros, que realmente logravam, com isso, evitar integralmente a competição entre as empresas, de forma que todas pudessem ser beneficiadas pelo acordo.
As fraudes no caráter competitivo dos processos licitatórios começaram a ocorrer em outubro de 2015 e dizem respeito a, pelo menos, 23 obras de construção e/ou reforma de escolas públicas em diversas cidades do Estado de Mato Grosso, cujo valor total ultrapassa o montante de 56 milhões de reais.
O Gaeco destacou o papel preponderante de Giovani Belatto Guizardi que foi elencado pela organização criminosa como a pessoa responsável pela arrecadação da propina que era paga pelos empreiteiros com a finalidade de garantir o êxito no recebimento pelas medições subsequentes das obras contratadas pela Seduc.
Ainda de acordo com as investigações ficou devidamente comprovado que após o pagamento por parte da Seduc aos empreiteiros o valor de (inicialmente 5% e posteriormente de 3%) era devolvido a parte da organização criminosa através do arrecadador da propina Giovani Belatto Guizardi.
Veja abaixo a íntegra da decisão:
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo Dr. Artur Barros Freitas Osti durante o Plantão Judiciário e recebido em meu gabinete na data de 5.5.2016, às 09h30min, em favor de Fábio Frigeri, apontando como autoridade coatora a MM.ª Juíza da 7ª Vara Criminal de Cuiabá.
Relata o impetrante que o paciente encontra-se segregado desde 3.5.2016, em decorrência da deflagração da “Operação Rêmora”, coordenada pelo GAECO, com a finalidade de investigar a prática de crimes contra a Administração Pública e de organização criminosa no âmbito da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso (SEDUC).
Esclarece que, conforme a acusação, a organização criminosa seria composta por três núcleos: a) dos servidores públicos, b) de operação e c) de empresários que, de forma organizada, fraudavam o caráter competitivo de licitações ocorridas no âmbito da SEDUC-MT, com o pagamento de vantagem indevida exigida pelo núcleo de operação.
Expõe o impetrante que, segundo relatos, o paciente supostamente integraria o núcleo de servidores públicos, composto igualmente por Wander Luiz dos Reis e Moisés Dias da Silva, que também foram presos por ordem expedida e oriunda da presente operação.
Argumenta que a magistrada singular, na parte em que decretou a prisão preventiva do paciente limitou-se a tecer comentários acerca de interceptações telefônicas em que ele supostamente tratava sobre as licitações no âmbito da SEDUC-MT, porém, no seu entender, “nada do que foi interceptado foge de suas funções”.
Defende que, em relação ao paciente, os indícios de autoria criminosa, “para não dizer inexistentes, são de uma fragilidade gritante que não autorizaria sequer o recebimento de denúncia em seu desfavor, muito menos a decretação da medida extrema”, de modo que a decisão decretada na origem se deu de forma precipitada e sem que estivessem presentes os requisitos autorizadores previstos no art. 312 do CPP.
Assim, acentuando que a prisão do paciente mostra-se ilegal, pede, liminarmente, a concessão da ordem, com a expedição imediata de alvará de soltura, para que ele possa responder ao processo em liberdade, aplicando, se necessário, medida cautelar alternativa, nos termos do art. 319 do CPP. No mérito, pede a confirmação da liminar,
Com a inicial foram juntadas cópia da decisão que decretou a prisão preventiva, além de documentos pessoais do paciente e comprovante de residência (sem numeração).
É o relatório.
Conforme entendimento sedimentado no STF, o deferimento de liminar, em sede de habeas corpus, especialmente durante o Plantão Judiciário, constitui medida excepcional por sua própria natureza, justificada apenas quando a decisão impugnada estiver eivada de ilegalidade, demonstrada de plano, e desde que preenchidos os pressupostos legais, consistentes no fumus boni iuris e no periculum in mora.
Na presente hipótese, contudo, tais circunstâncias não restaram evidenciadas de forma incontroversa, pois ao menos em uma análise superficial do feito, observa-se que a decisão que decretou a custódia provisória do paciente foi elaborada com base em elementos concretos que, por ora, demonstram que a sua liberdade poderá por em risco a instrução processual, diante de seu suposto envolvimento no esquema criminoso de fraudes no âmbito da SEDUC-MT, consubstanciado pelas tratativas em conversas telefônicas com os demais envolvidos, fato descortinado por meio de interceptações telefônicas.
Assim, parece-me que a custódia cautelar baseou-se em elementos que caracterizam o periculum libertatis do paciente, necessários à sua efetivação.
Com tais considerações, indefiro a liminar pleiteada.
Oficie-se à autoridade apontada como coatora para que remeta a este Sodalício, no prazo de 5 dias, as informações que entender necessárias.
Distribua-se o feito a uma das Câmaras Criminais deste egrégio Tribunal de Justiça para o regular processamento.
Intime-se o impetrante acerca do inteiro teor deste decisum.
Cumpra-se.
Cuiabá, 5 de maio de 2016.
Desembargador Pedro Sakamoto
Plantonista