O Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea/MT) afirmou não ter como participar da “pesquisa cientifica” realizada Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) com o plantio de soja fora de época, por considerá-lo irregular e que resultarão na produção de “sementes piratas”.
A afirmação consta na manifestação que atende a uma determinação do desembargador do Tribunal de Justiça, Mário Kono e foi anexada aos autos dos Embargos de Declaração opostos pela Aprosoja.
Na ocasião, Kono havia determinado que o órgão acompanhasse o experimento.
“Assim sendo, como não houve o acompanhamento contínuo de tais áreas pelo INDEA -MT no sentido de realizar o acompanhamento epidemiológico da doença ao longo da safra, sendo as áreas simplesmente fiscalizadas, notificadas e autuadas buscando o cumprimento da legislação, e nem houve acompanhamento da EMBRAPA visando realizar “a análise assertiva sobre genética de populações do fungo com fins de avaliação sobre resistência ao uso de fungicidas”, conforme determinado pelo MAPA, não vemos de que forma podemos participar ou contribuir com tal estudo, que perante a nossa instituição não passam de “plantios irregulares de soja”, que cometeram inúmeras infrações, descumprindo as seguintes medidas fitossanitárias: calendário de plantio, destruição de plantas e iminente descumprimento do calendário de colheita e posterior plantio de soja em sucessão a soja, e manifestamente ainda pretendem descumprir as medidas previstas na IN 02/2017, que dispõe sobre a Fiscalização do Uso de Sementes e Mudas no Estado de Mato Grosso, retirando como “resultado da pesquisa” nada mais que a produção de “sementes piratas”, caracterizadas por produção fora dos meios legais”, diz um trecho do documento.
No documento, o Indea informou a ocorrência de Ferrugem Asiática nas 14 áreas plantadas, conforme demonstrado nos Laudos de Diagnóstico Sanitário, também juntado ao processo.
“Pelo presente informamos que foram realizadas fiscalizações nas áreas de cultivo extemporâneo, e realizadas coletas de amostras para fins de análise laboratorial, especificamente para verificação da incidência e severidade da ferrugem asiática da soja (Phakopsora pachyrhizi), as quais serão repetidas nesta semana (caso as plantações não tenham sido dessecadas). Em todas as propriedades elencadas para o referido “experimento” foi constatada a presença da doença, com grande variação de intensidade de doença entre as áreas”.
Risco ambiental
O Indea destacou também o risco ambiental da plantação extemporânea.
“O risco ambiental que a redução da eficiência dos fungicidas para o controle da Ferrugem asiática da soja pode acarretar é ainda mais devastador, pois acarretaria num aumento exponencial do uso de agrotóxicos, buscando compensar a redução nos índices de controle. Considerando ainda o risco de extinção das moléculas fungicidas eficazes, haja vista que nos últimos anos dos três principais princípios ativos utilizados para o controle da ferrugem asiática (triazóis, estrobilurinas e carboxamidas), somente este último ainda apresenta eficiência no controle da doença. Cabe ressaltar, que a próprio setor de agroquímicos já se manifestou no sentido de não haver nenhuma molécula fungicida nova a ser lançada no mercado, viável economicamente, que apresente eficiência para o controle da doença. (...) Sendo assim, ressaltamos que a medida “calendário de plantio” é uma medida fitossanitária que visa prevenir que a última molécula eficiente no controle da ferrugem (grupo das carboxamidas) o deixe de ser, utilizando o princípio de “exclusão” (da mesma forma que temos agido para prevenção do COVID -19), pois quanto mais tempo o hospedeiro (soja) é exposto ao patógeno (Fungo causador da ferrugem - Phakopsora pachirizi), maior a chance de ser infectado, e considerando que a doença é policíclica, as várias gerações do patógeno no decorrer dessa longa safra aumentariam substancialmente as chances de mutação e surgimento de indivíduos resistentes (fungos que já não são controlados pelos fungicidas), o que traria resultados catastróficos à economia Mato -grossense, considerando que o estado é o maior produtor de soja do País, com área de mais de 9 milhões de hectares, sob os quais gira a economia mato-grossense”.
Armazenamento
Para o órgão, os grãos devem ser armazenados em armazéns gerais e que colheita e a destinação do produto deve ser acompanhada por oficial de justiça, com apoio de força policial, ante a possibilidade de "troca de um material previamente colhido como grão, pelo material que pretendiam usar como sementes salvas (de forma ilegal)".
Destruição
O órgão criticou ainda as teses suscitadas pela Aprosoja, entre elas a de que para a destruição haveria aglomeração de pessoas, o que não é permitido neste momento de pandemia mundial que o país vive.
“Finalizando os comentários acerca do agravo, beira ao ridículo a argumentação apresentada no item 15, que para a destruição da plantação de soja “mobilizaria um grande número de pessoas”, resultando em aglomeração de pessoas, haja vista que a atividade de destruição e de colheita pode ser realizada com exatamente o mesmo número de pessoas, mas duvido que a agravante solicitará a suspensão da colheita do material”, diz trecho da manifestação.
Entenda o caso
Tudo começou quando o MPE emitiu uma notificação recomendatória, para que o experimento fosse suspenso. Contra isso, a Aprosoja ajuizou uma ação, para que a Justiça reconhecesse a validade do acordo extrajudicial que autorizou a plantação de soja, no mês de fevereiro.
Paralelamente, o MPE protocolou uma séria de ações civis públicas contra diversos produtores rurais que, mesmo sendo notificados a destruírem o plantio, seguiram com o plano da Aprosoja. Após as ações, a Procuradoria-Geral do Estado emitiu parecer para anular o acordo extrajudicial que permitiu a plantação da soja em período extemporâneo – manifestação acatada pelo Indea.
Logo após, o juiz Rodrigo Roberto Curvo, da Vara Especializada do Meio Ambiente, atendeu o pedido liminar do MPE e mandou que os produtores rurais destruírem as plantações, estabelecendo o prazo de 72 horas.
Posteriormente, em recursos movidos no Tribunal de Justiça, os desembargadores Márcio Vidal e Maria Aparecida Ribeiro concederam a suspensão dos efeitos da decisão de primeira instância, enquanto o desembargador Luiz Carlos da Costa manteve os efeitos da mesma.
Diante do conflito de competência, o desembargador Paulo da Cunha atendeu pedido da Aprosoja e suspendeu a destruição das plantações de soja, até que seja assegurado entendimento consolidado.
Os recursos foram redistribuídos ao desembargador Mário Kono, que atendeu o agravo de instrumento movido pela Aprosoja e impediu a destruição. Inconformada, a entidade interpôs Embargos de Declaração, que foram rejeitados e o magistrado determinou que a colheita da soja plantada fora de época em Mato Grosso seja armazenada em silos, até que haja uma decisão definitiva que autorize a comercialização do produto.
O MPE também ingressou com agravo de instrumento para revogar a decisão de Kono. O recurso ainda será apreciado.
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