O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou a ordem de busca e apreensão e, consequentemente, as provas produzidas contra a deputada federal, Rosa Neide, acusada de participar do suposto desvio de R$ 1,1 milhão da Secretaria de Estado de Educação (Seduc).
A decisão foi disponibilizada nesta quarta-feira (11).
A nulidade das informações colhidas a partir dos documentos e aparelhos eletrônicos confiscados pela Polícia Civil na residência de Rosa Neide, gerou em torno da incompetência do juízo da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, que autorizou a deflagração da Operação Fake Delivery, em agosto de 2019.
A situação foi levada ao Supremo por meio de uma reclamação ajuizada pela Câmara de Deputados, que alegou que a Vara usurpou competência do STF, tribunal responsável por processar e expedir medidas contra parlamentares, que devem ainda ser encaminhadas à Casa Legislativa para aprovação.
Em setembro do ano passado, a investigação contra a deputada acabou sendo suspensa por liminar deferida pelo ministro. Agora, Alexandre de Moraes decidiu anular de vez o mandado de busca e apreensão e as provas obtidas a partir dele.
Ao longo da nova decisão, o ministro esclareceu que o juízo de primeira instância não deveria ter atuado no caso e que a interferência indevida acabou por desrespeitar não só a prerrogativa garantida à deputada, como também violou a reserva jurisdicional e o princípio do juiz natural.
“Não seria razoável ao juiz de 1º grau, que determinasse a colheita de provas na residência oficial ou no próprio local de trabalho de um parlamentar federal, ainda que sob a justificativa de investigar fato anterior ao mandato, violar a intimidade e a vida privada do congressista, no curso de investigação criminal conduzida por autoridade a qual falace tal competência, o que poderia subverter, por vias oblíquas, o desenho normativo idealizado pela Carta Política de 1988 para o processo e julgamento, pela prática de crimes comuns, dos detentores de mandatos eletivos federais”.
Na visão do ministro, o mandado expedido por autoridade incompetente gerou risco à prerrogativa funcional da deputada, assim como expôs ilicitamente a intimidade dela quanto o próprio exercício de suas atividades parlamentares.
“Não se trata de estabelecimento de prerrogativa de foro a determinados locais, mas sim, de absoluto respeito ao princípio do juízo natural e ao devido processo legal, que exigem que a ordem seja emitida contra aquele que tem a responsabilidade legal pela casa legislativa e pela gestão de seus documentos, utensílios, computadores, etc”.
Árvore envenenada
A teoria dos frutos da árvore envenenada foi utilizada por Alexandre de Moraes para declarar a nulidade de todas as provas oriundas da busca e apreensão. Isso porque os elementos obtidos a partir de uma conduta ilícita contamina as demais provas.
“Portanto, na presente hipótese, são ilícitas todas as provas obtidas a partir das diligências realizadas na residência particular da parlamentar federal, bem como todas aquelas delas derivadas, mesmo se reconduzidas aos autos de forma indireta, devendo, pois, serem desentranhadas do processo, não tendo, porém, o condão de anulá-lo, que deverá prosseguir com a permanência válida das demais provas lícitas e autônomas delas não decorrentes, ou ainda, que também decorreram de outras fontes, além da própria prova ilícita, por serem consideradas provas com fontes independentes”, concluiu o ministro.
A operação
Além de Rosa Neide, a operação também mirou o ex-secretário adjunto da Seduc, Francisvaldo Pereira de Assunção, que chegou a ser preso, mas logo foi colocado em liberdade.
A operação apurou o destino de mais de R$ 1,1 milhão em materiais “supostamente” entregue na sede Seduc, à Francisvaldo. As informações foram remetidas à Delegacia Fazendária em 2017, através do Gabinete de Transparência e Combate à Corrupção, indicando problemas na aquisição dos produtos, tendo como destinatário final unidades escolares indígenas, no final do ano 2014.
Cinco irregularidades foram detectadas, sendo elas: ausência de comprovação da necessidade de aquisição dos materiais de expediente para escolas indígenas no montante comprado; ausência de planejamento nas aquisições; ausência de comprovação de vantagens na adesão carona de registro de preço nº. 05/2013 – derivada do Pregão Presencial nº. 04/2013, da Fundação de Apoio e Desenvolvimento da Universidade Federal de Mato Grosso – Fundação Selva; ausência de elaboração de contratos, vez que foram substituídos por ordens de fornecimento e ausência de comprovação de destino de material de expediente, no valor de R$ 1.134.836,76.
Elementos iniciais da análise dos processos apontam que parte dos materiais escolares foram entregues no setor de patrimônio da Seduc, correspondente ao valor de R$ 884.956,48 e que o montante de R$ 1,1 milhão em produtos foi “supostamente” entregue à Francisvaldo Pereira de Assunção, sem que restasse evidenciado o destino desse volume expressivo de mercadoria.
O recebimento das mercadorias diretamente pelo investigado, sem a identificação de entrega no setor de patrimônio, foi ratificado por provas testemunhais e documentais.
Na investigação, há ainda outro indicativo de que os materiais foram adquiridos já com o propósito criminoso de desviar o patrimônio público em benefício particular, vez que o próprio coordenador da Coordenadoria de Educação Escolar Indígena (2010/2016) declarou que não lhe foi solicitado qualquer tipo de informação.
Destaca-se a gravidade dos eventos criminosos, vez que cada recebimento irregular teria consumado um crime de peculato, ocorrendo, assim, 28 atos que indicam o delito em continuidade delitiva.
As testemunhas ouvidas indicaram que a aquisição seria uma determinação da então secretária, a deputada federal Rosa Neide Sandes de Almeida. Em seu depoimento na Delegacia Fazendária foi detectado contradições, razão que motivou o pedido de busca e apreensão em desfavor dela.
CONFIRA ABAIXO A DECISÃO COMPLETA: