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Cuiabá, 13 de Julho de 2025

Opinião Segunda-feira, 16 de Março de 2020, 08:35 - A | A

Segunda-feira, 16 de Março de 2020, 08h:35 - A | A

Os atrasos contratuais reiterados pela administração pública: Efeito Rebote

Os habituais atrasos nos pagamentos contratuais pelo ente público tem gerado prejuízos não apenas às empresas e profissionais contratados, mas também ocasionado um prejuízo rebote ao próprio Poder Público

Pelo princípio constitucional da eficiência, a Administração Pública tem o dever de contratar produtos e serviços não apenas pelo valor de mercado, mas pelo melhor preço possível.

Na prática, contudo, a questão se complica. Os habituais atrasos nos pagamentos contratuais pelo ente público tem gerado prejuízos não apenas às empresas e profissionais contratados, mas também ocasionado um prejuízo rebote ao próprio Poder Público.

É da essência dos contratos administrativos a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, ou seja, a preservação, durante a vigência do contrato, das condições efetivas da proposta, por expressa disposição constitucional. Na realidade, isso impõe, no caso de atraso de pagamentos, a recomposição da mora mediante pagamento da atualização monetária e juros pertinentes à parcela em atraso, independente até da previsão contratual, afinal, decorrente de mandamento constitucional.

Além disso, na formulação das propostas aos entes públicos, não há dúvidas de que esses atrasos constantes são levados em consideração, funcionando como uma espécie de spread embutido no preço da proposta. O risco de inadimplemento ou atraso inerente ao Poder Público – não se pode negar que seu rating de crédito é baixo – já gera no particular a necessidade de previsão de uma proposta hábil a suportar essas inconsistências.

Na medida em que, num ambiente de negociações normais de mercado, os valores são fixados de acordo com prazos e capacidade de pagamento do tomador do serviço, não seria realmente crível exigir do particular proposta de preço regular, quando existente o sério risco de atraso reiterado nos pagamentos.

Essa imprevisibilidade se mostra totalmente prejudicial ao mercado, pois compromete o fluxo de caixa das empresas e, considerando ainda a necessidade de adequação das propostas aos valores de mercado, acaba por não atrair a participação dos melhores e mais bem preparados e capacitados fornecedores de produtos e serviços.

Empresas e profissionais mais capacitados ou detentores de melhores produtos/serviços optam, no mais das vezes, em não contratar com o Poder Público, sobretudo em razão da inconsistência e atraso nos pagamentos, ainda mais porque mesmo a quitação de consectários como atualização monetária e juros não conseguem compensar a alavancagem financeira e o custo das operações de crédito, custos de oportunidade e demais prejuízos derivados destes atrasos e da própria imprevisibilidade do cumprimento das obrigações contratuais.

É nesse sentido que o desequilíbrio fiscal, que desencadeia os costumeiros atrasos de pagamentos pela Administração Pública, afora os danos graves aos particulares, tem gerado cinco espécies de prejuízos ao próprio ente público: 1) o maior custo decorrente do pagamento de juros e correção monetária; 2) a deflagração de propostas contratuais não tão vantajosas, dado o baixo rating do Poder Público; 3) o afastamento das melhores empresas e profissionais do setor público; 4) a demora e dificuldade na implementação das políticas públicas concretizadas a partir dos contratos administrativos; 5) num cenário macro, o agravamento do desequilíbrio fiscal, com a majoração de restos a pagar...

É sob tal perspectiva que se faz altamente necessária a mudança histórica desses habituais atrasos, novamente incutindo nos particulares a credibilidade contratual da qual deve usufruir o Poder Público, que, na prática, constitui relevante instrumento de concretização do princípio da eficiência e economicidade do gasto público, notadamente à luz do binômio preço/qualidade.

Felipe da Rocha Florêncio é Advogado.