Cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram para reconhecer a legalidade da criação do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) em Mato Grosso.
Os posicionamentos partiram dos ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, que seguiram o voto do relator, Alexandre de Moraes, para reconhecerem a improcedência parcial da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2838 que o Partido Social Liberal (PSL) moveu contra a lei que implantou o Gaeco.
O julgamento, retomado nesta quarta-feira (19), não foi concluído por conta do voto vista do ministro Ricardo Lewandowski, que pretende estudar mais o assunto, antes de proferir seu voto.
Lei não fere a Constituição
No início do voto, o relator entendeu pela improcedência da ADI. Isso porque, ele não viu usurpação do Ministério Público em criar o grupo especial.
“Não há nenhuma inconstitucionalidade”, declarou.
Ele lembrou que a ação foi proposta em 2003, logo após a lei entrar em vigor, mas que atualmente todos os estados brasileiros, inclusive o Distrito Federal, possuem Gaecos, que atuam, na sua opinião, num combate mais efetivo à criminalidade.
“Não houve nenhuma invasão recíproca ou unilateral, de incompetência, não houve desrespeito à Constituição Federal. O que houve foi uma regulamentação legal, o que em vários estados ocorre por meio de convênios entre o Estado e o Ministério Público”.
“A efetividade vem demonstrada, a partir da criação [do Gaeco], em quase 800 investigações da criminalidade organizada, principalmente do narcotráfico, o Estado de Mato Grosso, por ser divisa de Estados produtores de drogas, sofre muito com a questão do narcotráfico e dos homicídios praticados em função do narcotráfico. É um dos Estados que tem maior problema, por ser um Estado que tem passagem com relação a isso, mais de 800 investigações conduzidas pelo Ministério Público da macrocriminalidade, ou seja, a Constituição autoriza. Não há aqui, ao meu ver, nenhum ferimento às funções institucionais do Ministério Público, porque é ele que coordena o órgão interno com o orçamento do Ministério Público e com apoio da Polícia Civil e Policia Militar, apoio que não desnatura, em momento nenhum, as funções da polícia judiciária, preventiva e repressiva”.
Alexandre de Moraes completou dizendo que os Gaecos foram “as melhores inovações em combate à criminalidade”.
“A lei reforça uma ideia importantíssima, que é o desfaio institucional atual do Brasil, a ideia de evoluir as formas de combate à criminalidade, só evolui o combate à criminalidade, à organização criminosa, à macrocriminalidade, à corrupção, efetivando o maior entrosamento dos órgãos governamentais, tanto para a investigação, quanto na repressão e na punição da corrupção. A legislação estadual pretendeu exatamente isso, fortalecer vínculos entre Ministério Público e o Executivo, na área da persecução penal, para possibilitar uma atuação mais eficiente”.
O relator, inclusive, citou o entendimento referendado pelo Supremo, de que o Ministério Público pode participar das investigações criminais.
Moraes votou pela improcedência parcial da ADI, por conta da parte que se referia à requisição pelo Ministério Público à administração serviços temporários de servidores civis e militares. O assunto, que estava sendo questionado pelo PSL, já havia sido revogado anteriormente.
Além da ADI de Mato Grosso, o ministro também analisou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4624, de Tocantins, que também pedia a nulidade da lei que instituiu o Gaeco naquele Estado.
Gaecos “extrapolam” limites
Para o ministro Ricardo Lewandowski, os Gaecos “escaparam completamente do controle dos órgãos hierárquicos”. Ele se posicionou para que sejam estabelecidos limites na atuação dos grupos especiais, uma vez que não pode transformar o Ministério Público num “superpoder”.
“Se tornaram órgãos autônomos, muitas vezes, extrapolando as competências institucionais e legais, atuando sem qualquer tipo de limitação. Essa é uma questão que preocupa não só a mim, mas os setores da cidadania. Talvez seja o momento para estabelecer os limites para esse tipo de atuação. Sabemos que o Ministério Público está prestando serviços excelentíssimos para a população brasileira, me parece que é preciso preservar valores”.
Ele reforçou que o Gaeco, em alguns casos, não respeita a competência do promotor natural após uma investigação.
“É chegado a hora de estabelecer alguns limites muitos claros. Se não vão atuar sem limitação”.
Alexandre de Moraes admitiu que o Ministério Público tem o poder de investigação, mas que este poder já passou a ser disciplinado pelo recém pacote anticrime.
“As suas atribuições estão na lei e não ferem as atribuições do promotor natural. A Lei Orgânica dos Ministérios Públicos e o Estatuto do Ministério Público da União ambos permitem que a investigação, antes de existir o promotor natural, pode ser realizada por designação do procurador geral, inclusive dos Gaecos. Os Gaecos só continuam após recebimento da ação se o promotor concordar”, explicou o relator.
Mas, mesmo após ouvir as explicações do relator, o ministro Ricardo Lewandowski decidiu pedir vista dos autos.