Da Redação
O procurador-geral da República, Augusto Aras, ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), no Supremo Tribunal Federal (STF), contra norma de Mato Grosso que instituiu o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e de Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), nas hipóteses de doações e heranças instituídas no exterior.
Segundo a Constituição Federal, o assunto somente poderia ser regulado por lei complementar, ainda não editada.
Além da norma de Mato Grosso, também foram ajuizadas ADIs contra leis dos Estados de Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins, e do Distrito Federal.
Ficaram de fora apenas Rio Grande do Norte, Roraima e Sergipe, onde não há legislação específica sobre o tema.
Nos documentos, também consta pedido para que o colegiado conceda medida cautelar a fim de suspender imediatamente os dispositivos que tratem do assunto, por afronta à jurisprudência do Supremo e à Constituição Federal.
Em outra ação sobre o tema – Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) –, a PGR requer que o Supremo reconheça a omissão inconstitucional do Congresso Nacional, por não ter editado lei de caráter nacional regulamentando a matéria.
Já na ADO, o requerimento é para que o STF fixe prazo razoável a fim de que o Congresso Nacional sane a morosidade em regular a matéria. Embora a Constituição Federal estabeleça que o assunto deva ser tratado em Lei Complementar, de caráter nacional, a Casa Legislativa ainda não editou a referida legislação.
Julgado no STF
O tema veio à tona no Supremo em março deste ano, quando os ministros julgaram o Recurso Extraordinário 851.108/SP, e decidiram ser vedado aos estados e ao Distrito Federal criar o ITCMD nas hipóteses de doações e heranças instituídas no exterior. Na mesma ocasião, a Corte modulou os efeitos da decisão, fixando que a regra passa a valer a partir da publicação do acórdão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo momento, nas quais se discuta: a qual estado o contribuinte deve efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; e a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente.
Diante desse cenário, Augusto Aras entendeu que é preciso tirar do mundo jurídico os dispositivos legais editados em desacordo com o artigo 155, parágrafo 1º, inciso III, da Constituição e com isso, impedir que órgãos da administração pública exijam ITCMD sem prévia edição de lei complementar federal.
Ressaltou, ainda, o fato de que, embora o julgado do STF deva ser seguido como paradigma por todas as instâncias da Justiça, a decisão não vincula a atuação dos órgãos da administração pública, o que reforça a necessidade da declaração de inconstitucionalidade.
ADIs
Segundo explicou Augusto Aras nos documentos, "as decisões em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida apresentam efeito vinculante restrito aos órgãos do Poder Judiciário (art. 927 do Código de Processo Civil), não tendo a mesma eficácia dos julgados emanados pela Suprema Corte em ações de controle concentrado de constitucionalidade, que vinculam tanto o Judiciário quanto a administração pública (art. 102, § 2º, da Constituição Federal e art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/1999)".
O artigo 155, parágrafo 1º, inciso III, da Constituição fixou que o ITCMD deve ser regulado por lei complementar nos casos em que o doador tiver domicílio ou residência no exterior ou quando o instituidor da herança possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado fora do Brasil.
Assim, a competência de estados e Distrito Federal para instituir ITCMD deve ser condicionada à prévia regulamentação por meio de lei complementar federal. Há possibilidade real de estados e Distrito Federal, caso instituam o tributo unilateralmente, adotarem critérios variados e conflitantes de cobrança e, com isso, ocasionarem bitributação e conflitos de competência tributária entre entes federativos.
“Conclui-se, portanto, ser inviável que estados e Distrito Federal instituam ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da CF, enquanto não for editada a lei complementar federal nele mencionada, sob pena de afronta a esse dispositivo e também ao art. 146, I e III, ‘a’, da Constituição Federal”. Quanto à modulação dos efeitos, caso seja declarada a inconstitucionalidade dos dispositivos estaduais e distrital, o PGR entende que deve ser adotado o mesmo critério utilizado pelo STF no julgamento do RE 851.108/SP.
Omissão do Congresso
Em razão da demora do Congresso Nacional em editar lei complementar nacional para regular o exercício da competência dos estados e do Distrito Federal relativo ao ITCMD, nas hipóteses de doação e heranças instituídas no exterior, a PGR requereu que o STF declare omissão inconstitucional na edição da referida norma e que torne efetivo o art. 155, § 1º, III, da Constituição, fixando prazo razoável para sanar a morosidade.
O próprio STF estabeleceu que a inércia deliberada das Casas Legislativas pode ser objeto da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, uma vez que a demora na discussão e na aprovação de leis é potencialmente lesiva à ordem constitucional.
Nesse sentido, Augusto Aras enfatizou a importância de que o Supremo se pronuncie sobre o assunto, pois a falta de edição de lei complementar nacional impede que estados e municípios instituam ITCMD nas hipóteses elencadas.
“O preceito [artigo 155, parágrafo 1º, inciso III, da CF] estabelece verdadeira obrigação ao Congresso Nacional, que tem o dever constitucional de disciplinar, por meio de lei complementar, o exercício da competência dos estados e municípios para instituir ITCMD nas hipóteses determinadas. Inexistente a norma, permanece inócua a determinação constitucional”. (Com informações da Assessoria do MPF)