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Cuiabá, 15 de Janeiro de 2025

Justiça Trabalhista Segunda-feira, 24 de Outubro de 2022, 15:15 - A | A

Segunda-feira, 24 de Outubro de 2022, 15h:15 - A | A

NO AMBIENTE DE TRABALHO

Empresa é alvo de ação após usar venezuelanos para influenciar votos

Na ação, o MPT relatou o assédio eleitoral e pediu que a Justiça faça a empresa cumprir cinco obrigações, sob pena de multa

Da Redação

O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) uma contra a empresa RSF Castelini Comércio Varejista de Vestuário (Castelini Confecções), de Campo Novo do Parecis, por assédio eleitoral.

Segundo a denúncia, o estabelecimento realizou reunião, em ambiente de trabalho, com o propósito de expor seus trabalhadores ao relato de uma suposta venezuelana, com o objetivo de interferir na escolha política que se dará neste segundo turno das eleições de 2022.

O MPT ressaltou que a influência e a pressão exercidas são ilegais e que a conduta precisa ser imediatamente reparada, considerando a proximidade do pleito eleitoral (30).

“A liberdade de manifestação do pensamento – que abrange a liberdade de orientação política – de um indivíduo não pode ser exercida com a finalidade de coagir, induzir ou mesmo com efeito de configurar qualquer tentativa de interferir na liberdade de pensamento e de posição política alheia. Ou seja, o respeito à liberdade de orientação política por uma pessoa não permite o esvaziamento desse mesmo direito de outrem. Esta situação, por certo, configura uma violência”.

Na ação, o órgão frisou que há inequívoco interesse público em se resguardar o pluralismo político em uma sociedade democrática. Isso significa dizer que o poder diretivo do empregador não pode impedir, em nenhuma hipótese, o exercício dos direitos de liberdade, de não discriminação, de expressão do pensamento e de exercício do voto, sob pena de se configurar um abuso desse direito, violando o valor social do trabalho.

“Deve-se ressaltar que no mundo do trabalho, especialmente em decorrência do poder hierárquico do empregador, a prática torna-se ainda mais perversa, pois coloca o trabalhador em conflito entre o direito de exercer a plena cidadania, em contraposição à necessidade de garantir a própria subsistência. Não há como negar, portanto, que essas circunstâncias revelam a situação de vulnerabilidade das pessoas economicamente dependentes e subordinadas (empregados), tornando-os suscetíveis às exigências abusivas empresariais”.

Para o MPT, ao agir assim, o empregador se valeu de sua ascendência hierárquica para alcançar situações externas ao contrato de trabalho, instaurando verdadeira atmosfera de temor na qual os empregados se veem coagidos a votar no candidato apoiado pelo patrão, sob a crença de que seus empregos estarão em risco se apoiarem ou elegerem outro candidato.

“O empregador não pode se valer do vínculo de emprego para manipular o debate público e o jogo democrático. Inclusive, em decisão tomada na ADI 4650, o STF [Supremo Tribunal Federal] entendeu pela impossibilidade de financiamento empresarial das campanhas políticas por parte das empresas – elas não devem participar da política”.

Denúncias

O MPT recebeu duas Notícias de Fato (NFs) em face da ré, relatando que supostos venezuelanos estariam sendo levados a estabelecimentos comerciais para fazer “palestras” em que relatam as condições de vida em seu país. No discurso, tentam persuadir trabalhadores a votar em um determinado candidato à Presidência, argumentando que, caso não o façam, o Brasil se tornará "comunista".

Além de uma reportagem publicada em veículo de comunicação, foram anexados dois vídeos que comprovam integralmente a prática ilícita e que detalham as informações contidas na matéria jornalística. Em uma das gravações, é possível visualizar, sem margem para dúvida, uma suposta venezuelana falando diretamente para empregados da ré. É possível, ainda, verificar que o nome da empresa aparece no uniforme dos trabalhadores reunidos no local.

O conteúdo da fala faz nítido discurso político tendente a influenciar os votos dos empregados nas eleições de segundo turno, especialmente quando menciona as consequências de um futuro governo “socialista”. A pretendida venezuelana diz que não gostaria que o Brasil passasse pela mesma situação que seu país de origem e que “quando um governo socialista ganha, não quer soltar”, em alusão clara à escolha para presidente a ser realizada. A natureza eleitoral do discurso também é percebida quando a palestrante fala que o governo decidiria pelas pessoas ali presentes o que elas não decidiram em votação.

Na ação, o MPT ressaltou que não tem opinião política, lado ideológico ou preferência partidária, e que pretende apenas impor a observância da ordem jurídica.

“Não há nessa demanda nenhuma intenção de adentrar em questões de cunho político, muito menos partidárias, eis que tais temas sequer têm lugar dentro atribuições previstas ao órgão pela Constituição Federal de 1988. Trata-se aqui da defesa de direitos fundamentais preconizados pela Constituição Federal de 1988: garantia da liberdade de orientação política e do direito à intimidade dos trabalhadores da empresa Ré. A finalidade, portanto, é assegurar a esses trabalhadores o exercício da cidadania plena, colocando fim a qualquer violência e assédio que vise à restrição ou coação por parte requerida”.

Caráter inibitório

A ação foi ajuizada com pedido de tutela provisória de urgência antecipada. O perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo mostrou-se evidente pela própria natureza das violações trabalhistas que se busca coibir.

“O ambiente de pressão político-partidária dentro do local de trabalho a que estão sendo submetidos os trabalhadores pode levá-los a realizar uma escolha de candidato à Presidência da República movida pelo medo da perda do emprego em detrimento à livre determinação de escolha política.”

A ação também tem caráter inibitório, visando à não continuação do ilícito, irrefutavelmente comprovado, conforme análise dos vídeos. “Os momentos eleitorais, em regra, são ocasiões em que as relações sociais são tensionadas e podem inflamar os ânimos da população, exigindo das instâncias decisórias de nosso país serenidade para lidar com questões relacionadas ao tema. Períodos como os ora vivenciados exigem que nossos esforços se voltem para o que há de objetivo e democrático no nosso país: a tutela dos direitos fundamentais delineados na Constituição Federal, fruto de construção social, cidadã e democrática”.

Pedidos

Na ação, o MPT requereu que a empresa seja obrigada, de imediato, ao cumprimento de cinco obrigações, sob pena de multa de R$ 20 mil por infração, acrescida de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado.

Indenização

Em razão do reflexo social negativo, o MPT também pediu, em caráter definitivo, a condenação da empresa ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 500 mil.

Esse tipo de reparação possui finalidade compensatória, punitiva e pedagógica.

“É importante que as empresas se sintam desestimuladas em fraudar a lei, o que certamente não ocorrerá se a única sanção que obtiverem da Justiça for a da obrigação do cumprimento da determinação legal, a qual já deveria ser observada espontaneamente”.

Denúncias de assédio eleitoral

O MPT -MT já tem instauradas 28 investigações a partir de denúncias de possíveis casos de assédio eleitoral. As denúncias vêm de todas as regiões do estado. Nacionalmente, o MPT registra 1.195 denúncias relacionadas ao assunto.

O “modus operandi” são os mais variados, indo desde promessas de benefícios e vantagens e ameaças de perda de emprego até a exigência de participação em manifestação político-partidária, mas sempre com o objetivo de interferir na liberdade de escolha do candidato pelos trabalhadores.

Denúncias de assédio eleitoral podem ser feitas pelo site mpt.mp.br ou pelo app MPT Pardal. (Com informações da Assessoria do MPT-MT)