O desembargador Gilberto Giraldelli, da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), defendeu a retomada do andamento processual de uma ação penal oriunda da Operação Rêmora.
O processo foi paralisado em fevereiro deste ano, após o relator do caso, desembargador Rondon Bassil Dower Filho, ver suposta atuação irregular do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) no decorrer da ação.
Ao julgar o habeas corpus que discute o caso, Rondon defendeu seu posicionamento e votou para anular todo o processo. Isso porque os promotores do grupo especializado atuaram na ação, mesmo após a denúncia ter sido recebida, ferindo o princípio do promotor natural. O julgamento não foi concluído por conta do voto vista do desembargador Gilberto Giraldelli.
Nesta quarta-feira (24), quando a discussão do caso foi retomada em sessão de julgamento por videoconferência, Giraldelli decidiu divergir do relator. Para ele, a atuação do Gaeco isolada ou conjunta com o promotor de justiça natural, em processos que envolvam organização criminosa, é facultativa.
"Do exame em conjunto, depreende-se que não há limitação para atuação dos promotores de justiça que integram o Gaeco nos feitos que apuram organização criminosa, mas sim uma ampliação do trabalho do órgão, haja vista a especialidade da matéria sendo perfeitamente admissível que atuem judicialmente, ainda que em revelia ao promotor que atua na vara, ao qual se prevê a atuação facultativa nos processos”.
Em relação à lei que criou o Gaeco, Giraldelli pontuou que a norma não limitou a atuação do grupo, mas apenas aperfeiçoou a metodologia, contemplando a atribuição dos membros, tanto na fase investigatória quanto na processual.
“Totalmente irrazoável e ilógico o esvaziamento da atuação ministerial especializada após o recebimento da denúncia, uma vez que os promotores de justiça que participaram das investigações detêm mais conhecimento acerca dos fatos ilícitos, a facilitar a exploração dos meios de provas em juízo que se dará com mais precisão para se formar a convicção do julgador, estando longe de se tratar de manipulação casuística ou designação seletiva de promotor a ensejar a propalada ofensa ao princípio do promotor natural”.
Desta forma, ele votou para afastar qualquer ilegalidade na atuação do Gaeco nesse caso e que o trâmite da ação seja retomado.
TJ já tem jurisprudência
Logo após, Rondon rebateu a tese do colega. Ele lembrou que o TJ já tem uma jurisprudência para esses casos quando, nos Embargos Infringentes 48046/2018, anulou todo o processo criminal após identificar a participação irregular do Gaeco no curso da ação.
“É interpretação de lei local. E sendo assim, a última palavra não é dos tribunais superiores, mas sim é do Tribunal de Justiça. Esse tribunal já se manifestou sobre o tema, através da Turma de Câmaras Criminais Reunidas, de forma que se nós decidirmos contra a jurisprudência deste tribunal estaremos indo contra um entendimento das três câmaras criminais”.
“Em julgamentos semelhantes no STF [Supremo Tribunal Federal], já se decidiu dessa forma, de quem dá a última palavra sobre interpretação de lei local é o Tribunal de Justiça e, hoje, estamos debatendo interpretação de lei local contra jurisprudência local. Não posso concordar com isso. Primeiro, porque é habeas corpus. E, segundo que já temos entendimento firmado. Vamos mudar esse entendimento então?”, questionou o relator.
“Promotores do Gaeco possuem competência para atuar isoladamente até o recebimento da denúncia, e sobretudo em casos que versam sobre organização criminosa”, complementou o relator.
Voto vista
Após ouvir os posicionamentos, o desembargador Juvenal Pereira da Silva decidiu pedir vista dos autos, a fim de definir sua convicção sobre o assunto.
Entenda o caso
A ação em questão é fruto da Operação Rêmora, deflagrada em maio de 2016, que investigou um esquema de combinação de licitações no valor de R$ 56 milhões para reformas e construções de colégios na Secretaria de Educação.
Nesse referido processo são réus: Leonardo Guimarães Rodrigues, Moises Feltrin, Joel de Barros Fagundes Filho, Esper Haddad Neto, José Eduardo Nascimento da Silva, Luiz Carlos Ioris, Celso Cunha Ferraz, Clarice Maria da Rocha, Eder Alberto Francisco Meciano, Dilermano Sergio Chaves, Flavio Geraldo de Azevedo, Júlio Hirochi Yamamoto Filho, Sylvio Piva, Maria Lourenço Salem, Alexandre da Costa Rondon, Benedito Sergio Assunção Santos e Leonardo Botelho Leite.
Em fevereiro passado, o desembargador Rondon atendeu limitar em habeas corpus impetrado pelos advogados Ulisses Rabaneda e Renan Fernando Serra Rocha Santos, que representam o empresário Joel Barros Fagundes Filho.
Os advogados alegaram que, após as investigações e o recebimento da denúncia, o Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco) permaneceu atuando no caso, o que fere o princípio do promotor natural e à Lei Complementar 119/2002 que criou o grupo.
Eles citaram que nas audiências realizadas em novembro e dezembro passado foram acompanhadas pelos promotores de Justiça, Jaime Romaquelli e Kledson Dionysio de Oliveira, que integram o Gaeco.
Desta forma, pediram, liminarmente, a suspensão do trâmite do processo, sendo atendidos pelo relator.
O mérito do HC pede a nulidade de todos os atos praticados pelo grupo especial do MPE após o recebimento da denúncia.
CONFIRA ABAIXO A SESSÃO NA ÍNTEGRA: