“Condenar fora das provas dos autos, ainda que eu tenha a crença de que o acusado seja criminoso, não é praticar a justiça, mas justiçamento”.
Com esse entendimento, o desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Orlando Perri, votou pela absolvição do deputado estadual Gilmar Fabris, condenado pela maioria do Pleno, pelo crime de peculato.
Em 102 páginas, Perri destacou sua imensa preocupação de não julgar o réu conforme ele é visto por muitos da sociedade, ou seja, como corrupto. Ele esclareceu que o que estava em julgamento era o fato criminoso e não o homem.
“É com a preocupação de não julgar o estereótipo do “político corrupto” – como o réu se apresenta para muitos na sociedade –, mas o fato criminoso a ele imputado, que analisarei as provas dos autos, segundo as impressões que tocam meu espírito. E assim o faço em respeito e obediência ao nosso sistema de justiça, que não tolera e não permite o direito penal do autor, onde se julga o homem, e não o fato criminoso a ele atribuído. Minhas convicções, tiradas do acervo probatório, são assentadas naquilo que, a meu ver, se provou nos autos, e não sobre os meus conceitos ou preconceitos que tenha a respeito do réu”, destacou em seu voto cujo Ponto na Curva teve acesso a íntegra.
O desembargador citou que ao elaborar o voto chegou a se questionar se não tinha a mesma opinião da testemunha Doralice Garcia Rodrigues, que, afirmou com todas as letras que o deputado Gilmar Fabris é “um ladrão de marca maior”.
Sendo assim, estudou atentamente o caso e ainda buscou guarida em obras de Psicologia que tratam da convicção pessoal, para poder separá-la com relação do direito penal, buscando se convencer com as provas dos autos.
“Existindo um estereótipo formado na convicção de um juiz – “fulano de tal ou o político tal é corrupto” – há uma tendência de o juiz, naturalmente, de maneira consciente ou inconsciente, buscar nos autos as provas que confirmem suas crenças e pré-conceitos, arraigados no seu espírito por uma multiplicidade de fatores e informações, apofânticas ou não. Em situação tal, a condenação antecede até o processo, porque o juiz já casou com a culpa preestabelecida a partir de sua crença pessoal. Pode o juiz até acreditar numa proposição; entretanto, se não estiver comprovada nos autos, cumpre-lhe abandoná-la para conformar sua decisão de acordo com aquilo que as provas autorizam inferir a partir de uma análise racional delas”, explicou.
Corrupção
Perri citou também a descrença e decepção com a política, fatores que fazem com que “o homem comum espere do juiz, que é visto, em certos momentos, como o anjo da espada flamejante que desceu dos céus para expulsar os crimes da face da terra”.
“A culpa ou a inocência se proclama no processo, pelo que dizem e autorizam as provas produzidas, e não por aquilo que a multidão ensandecida grita das ruas”, frisou.
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Condenação
Por maioria, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso condenou o deputado Gilmar Fabris pelo crime de peculato, praticado quando atuou como presidente da Assembleia Legislativa.
Ele também chegou a ser acusado por ocultação de dinheiro, mas foi absolvido, pois na época não era tipificado como delito.
Foram 23 votos, sendo 15 pela condenação e 8 pela absolvição.
A pena é de reclusão, mas a punibilidade deve ser extinta por alcançar a prescrição, já que o crime foi cometido no ano de 2016.
A condenação não cassa o mandato do parlamentar e nem suspende seus direitos políticos.