As condutas que acarretam sanções graves – como a privação de liberdade, por exemplo – precisam estar claramente definidas na lei. Foi o que defendeu o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira.
O Plenário analisa cinco ações diretas de inconstitucionalidade contra vários dispositivos da Lei nº 13.869/2019, conhecida com Lei de Abuso de Autoridade.
A norma define os crimes de abuso de autoridade cometidos por agentes públicos, sejam servidores ou não. Para o PGR, não pode haver dúvida sobre qual comportamento é objeto de punição na lei, por exigência do Estado Democrático de Direito e do princípio da segurança jurídica.
A lei de abuso de autoridade é questionada nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6236, 6238, 6239, 6266 e 6302, que apontam problemas em diversos dispositivos. Para o PGR, alguns dispositivos apresentam condutas abertas, sem especificação, o que pode gerar interpretações variadas e fragiliza a atuação de magistrados, integrantes do Ministério Público e outros agentes.
Não tipificação de condutas
Com o objetivo de contribuir para o debate e para a decisão que será tomada pelos ministros, Gonet apresentou considerações, apontando problemas em trechos da norma. O artigo 30, por exemplo, pune com detenção de um a quatro anos o agente público que der início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada.
“O que é justa causa, que tipo de justa causa se leva em conta em cada momento do processo?”, perguntou o procurador-geral.
“A todo instante, o processo poderá ser interrompido para que o juiz explique por que motivo aquela ação deve prosseguir, se há ou não justa causa”, afirmou.
O mesmo problema aparece no art. 31, que pune a extensão injustificada da investigação, e no art 1º, que criminaliza as condutas praticadas por “por mero capricho ou satisfação pessoal”.
“Todo o sistema constitucional parece ter sido concebido para garantir àquelas autoridades que atuam no campo do conflito de interesses a independência, a tranquilidade e a segurança para atuar”, disse o PGR. “O que o constituinte quis do Judiciário, do Ministério Público e de outras autoridades é coragem para exercer suas funções. Uma lei que debilita essa coragem, uma lei que leva a dúvidas sobre o que pode ou não ser feito, não está de acordo com esse propósito evidente do constituinte”.
O procurador-geral defendeu que qualquer tipo de abuso deve ser punido, inclusive o de autoridade.
“A questão é que esse abuso tem que estar bem definido. Talvez esse seja o parâmetro para avaliar cada um dos dispositivos que estão questionados nessas ações”, concluiu. Em pareceres enviados ao Supremo em 2021, o MPF opinou pelo não conhecimento das ações ou pela sua improcedência. Ao falar no Supremo, Gonet manteve esses posicionamentos. (Com informações da Assessoria do MPF)