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Opinião Quinta-feira, 19 de Março de 2020, 11:57 - A | A

19 de Março de 2020, 11h:57 - A | A

Opinião /

De Lisboa, um olhar além do oceano sobre o COVID-19

Agora, o governo pode decretar medidas que restrinjam direitos e liberdades fundamentais, como o direito de ir e vir, a liberdade de culto, de reunião e até de expressão



Pelo que tenho visto, cá do outro lado do oceano, o brasileiro ainda não entendeu a dimensão do COVID-19.

Estou morando em Lisboa e, apesar de não ser profissional da saúde, vou tentar contribuir para afastar essa apatia social que tem negado importância à doença e à sua disseminação.

Poderia trazer estatísticas das mais diversas, retiradas dos sites mais confiáveis, mas isso você recebe todo dia pelas mídias sociais e pode ver também pela internet. Mando-te apenas um número e então passo a dizer o que estou vendo por aqui. Assim, talvez você compreenda e reverbere minha preocupação. Na Itália, em um dia (entre 17 e 18 de março), morreram 475 pessoas de COVID-19.

Aqui em Lisboa, há filas para entrar nos mercados (ontem passei 1 hora). As pessoas naturalmente ficam com a distância de pelo menos 1 metro umas das outras; nas farmácias, a mesma coisa. São os locais que permanecem abertos, mas com limitação imposta pelo governo de redução do número máximo de pessoas ao mesmo tempo no estabelecimento. Em alguns momentos tem havido falta de carne e frango.

As ruas estão vazias. Faculdades, escolas, academias, bares, restaurantes e pontos turísticos estão fechados. Os idosos e pessoas que integram grupo de risco não estão saindo de casa e seus vizinhos estão indo ao mercado e à farmácia por eles. Os hospitais já estão lotados e com dificuldade de atendimento. À noite, eu que moro num local bem central de Lisboa, só ouço sirenes de ambulâncias indo e vindo. As poucas pessoas na rua conversam à distância, não se cumprimentam de perto. A polícia foi reforçada nas ruas. Sabe por quê? Para evitar aglomerações de pessoas. Onde houver pessoas reunidas ou aglomeradas, deve orientar a dispersão, inclusive com uso da força se necessário.

Portugal decretou ontem estado de emergência (semelhante ao nosso estado de defesa/sítio). Agora, o governo pode decretar medidas que restrinjam direitos e liberdades fundamentais, como o direito de ir e vir, a liberdade de culto, de reunião e até de expressão. É possível, agora, estabelecer toque de recolher, prisão a quem andar na rua sem uma razão especial e fundamentada (o que parece que já vem ocorrendo na Espanha e na Itália). O Presidente português falou na televisão emocionado, contou a história do país e tratou o fato como uma luta da humanidade. Convocou os portugueses para o enfrentamento, cada um como puder, mas todos em casa, evitando a transmissão. A maioria tem acatado. O sentimento aqui é de solidariedade, preocupação e cuidado uns com os outros.

Brasileiro, se você não tem medo de morrer, de ter apenas uma “gripezinha”, tenha consciência em não ser um vetor, em não disseminar o vírus de maneira tão rápida que nossos sistemas – já colapsados há muito tempo – não suportem.

Meu apelo é para que você, leitor, receba essas palavras não como difusoras do caos e do pânico, mas como um chamado a essa luta passiva, em que precisamos recuar, e não atacar. A humanidade certamente passa pela maior provação da nossa geração. A nós, brasileiros, basta olhar além do oceano. O vírus veio da China, passou pela Europa e chegou ao Brasil. Tivemos tempo para aprender. A China e a Europa têm aprendido com a dor. Usemos a experiência e o exemplo de quem está penando com o COVID-19. Fiquemos em casa!

De Lisboa, em casa já há alguns dias e assintomático, Leonardo Vieira é Procurador do Estado de Mato Grosso (licenciado para mestrado em Portugal)