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Cuiabá, 04 de Julho de 2025

Justiça Estadual Terça-feira, 11 de Julho de 2017, 15:12 - A | A

Terça-feira, 11 de Julho de 2017, 15h:12 - A | A

recurso de defesa negado

TJ entende que extinção de punibilidade pode ser decretada a qualquer momento

A turma julgadora decidiu desprover o recurso de apelação impetrado pela ex-servidora da Fema, Fabrina Junqueira e o advogado Alcides Batista Neto, que pediram a absolvição da acusação de corrupção passiva e advocacia administrativa

Lucielly Melo

A extinção de punibilidade pelo advento da prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal constitui matéria de ordem pública, reconhecível em qualquer fase do processo e em todos os graus de jurisdição, inclusive pela autoridade de primeiro grau após a prolação da sentença condenatória, porque lhe cabe resolver todos os incidentes posteriores à sentença condenatória.

A tese é defendida pela Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que rejeitou o pedido de apelação da defesa da ex-servidora da antiga Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema) Fabrina Ely Gouvea Finochio Junqueira e do advogado Alcides Batista de Lima Neto, que pediu a absolvição dos réus por entender que eles são inocentes do crime de advocacia administrativa e corrupção passiva. 

"Constitui, portanto, matéria de ordem pública, reconhecível a qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente da existência ou não de recurso da defesa"

Para a câmara julgadora, a sentença de extinção da punibilidade pela prescrição tem natureza apenas declaratória, constituindo providência que visa dar efetividade e celeridade ao processo penal e tornar rescindida a condenação por fato processual ocorrido após a condenação, qual, seja, o trânsito em julgado para a acusação, de que depende a caracterização dessa modalidade de extinção da punibilidade, impedindo a formação da coisa julgada material e demais efeitos secundários. 

“Desta forma, somente um apego demasiado ao formalismo poderá conduzir o tribunal a considerar que a declaração da prescrição retroativa só poderá ser efetuada em segunda instância, por meio de habeas corpus ou de revisão criminal”, diz um trecho da decisão.

A defesa impetrou o recurso de apelação de absolvição e depois impetrou um Rese – Recurso em Sentido Estrito – a fim de reformar a decisão que extinguiu a punibilidade dos réus lavrada pela juíza Selma Rosane Arruda, titular da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, por entender que são inocentes.

“Requer a modificação da sentença no sentido de que seja constado a desclassificação do crime ante o fenômeno da prescrição e que portanto não se pode aferir a culpabilidade do Recorrente”, argumentou a defesa.

Após uma denúncia, recebida em 2008, a juíza Selma Rosane decidiu condenar em abril de 2016, além de Fabrina e Alcides, mais três pessoas envolvidas.

Fabrina foi condenada a cinco anos e quatro meses de reclusão e Alcides a quatro anos e dois meses de reclusão.

Contudo, a juíza reconheceu a ocorrência do trânsito em julgado para a acusação e declarou por sentença lavrada em agosto de 2016, a extinção de punibilidade de todos os condenados, ante o advento da prescrição retroativa, visto que transcorreu oito anos e assim a prescrição atingiu os crimes mencionados.

Sentença

A analisar o autos, o desembargador e relator da ação, Juvenal Pereira da Silva, entendeu que a o cerne da defesa é o “reconhecimento da incompetência do Juízo de Primeiro para reconhecer a prescrição retroativa após a prolação da sentença condenatória, que atribui ao Juízo da Execução Penal ou ao Tribunal de Justiça”.

"Constitui, portanto, matéria de ordem pública, reconhecível a qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente da existência ou não de recurso da defesa", entendeu o relator. 

"Não sendo possível agasalhar a tese defensiva acerca da nulidade processual da sentença declaratória, decorrente da incompetência do Juízo de primeira instância, torna-se igualmente inviável conclamar a análise dos temas relativos à possível absolvição dos recorrentes, uma vez que não há, em absoluto, sentença condenatória a ser analisada"

Para ele, o reconhecimento da prescrição visa dar efetividade e celeridade ao processo penal, tornando cancelada a condenação por fato processual ocorrido após a sentença, “impedindo a formação da coisa julgada material e demais efeitos secundários”.

“E, ao contrário do que pode parecer à súplica defensiva, se ao juiz de primeiro grau de jurisdição é facultado conceder habeas corpus de ofício (art. 654, § 2º, do CPP), incluindo os atos próprios que causem indevido constrangimento ilegal às liberdades das pessoas acusadas, naturalmente, sobrevindo aos autos fato processual posterior e relevante que determine a prescrição da pretensão punitiva estatal (no caso, o trânsito em julgado para a acusação), evidentemente não só poderá, como deverá ele mesmo reconhecê-la e declará-la antes de transitar em julgado definitivamente a condenação, sem necessidade de provocação da parte ou de qualquer outro órgão judiciário de qualquer grau de jurisdição, porque lhe cabe resolver todas as questões incidentais surgidas antes da subida dos autos à instância ad quem, incluindo o reconhecimento da prescrição retroativa caso ela venha a ser reconhecida, o que só pode ocorrer, como visto alhures, após o trânsito em julgado para a acusação ou, em havendo recurso acusatório, depois de desprovido o seu recurso”, explicou.

Ainda em seu voto, o magistrado relator defendeu que a rescisão da condenação e de todos os seus efeitos, torna evidente prejudicada a pretensão de análise do mérito do recurso interposto pela defesa dos réus.

“Logo, não sendo possível agasalhar a tese defensiva acerca da nulidade processual da sentença declaratória, decorrente da incompetência do Juízo de primeira instância, torna-se igualmente inviável conclamar a análise dos temas relativos à possível absolvição dos recorrentes, uma vez que não há, em absoluto, sentença condenatória a ser analisada”, entendeu Juvenal.

A maioria dos desembargadores da corte julgadora seguiu o voto do relator, que ainda decidiu conceder a ordem de habeas corpus para que remeta a apelação ao Tribunal de Justiça, após sua devida instrução.

Entenda o caso

Os fatos ocorreram na extinta Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema), entre os anos de 2004 e 2005, época em que era presidida pelo ex-deputado Moacir Pires e vieram à tona como desdobramento da “Operação Currupira”, realizada pela Polícia Federal e Ministério Público Federal.

De acordo com a sentença, proferida pela juíza Selma Rosane Santos Arruda, da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, as provas anexadas ao processo, como documentos, dados telefônicos, arquivos de computador e depoimentos, revelaram que Fabrina Ely Gouvea exercia cargo comissionado na Fema e, nessa condição, tinha informações sobre as autuações que eram feitas pelas equipes de fiscalização do órgão.

De posse desses dados, conforme a sentença, em conluio com o advogado Alcides Batista de Lima Neto, entrava em contato com os autuados e oferecia a eles seus “serviços” visando promover suas defesas no âmbito administrativo, perante o próprio órgão ambiental. Após a contratação dos “serviços” a dupla preparava as defesas dos “clientes” e as apresentava na Fema, constando, apenas, a assinatura de Lima Neto. Depois disso, com a influência de Fabrina Gouvea, as defesas e recursos administrativos eram julgados e as multas aplicadas eram reduzidas.

No computador que supostamente era utilizado pela servidora foram encontrados modelos de cartas oferecendo serviços de advocacia, encaminhadas às pessoas que eram autuadas pelo órgão ambiental, bem como várias defesas e recursos administrativos em nome dos infratores.

Clique aqui e veja a decisão na íntegra.