O ex-governador Silval Barbosa expôs em sua delação que a ajuda financeira “oculta” na campanha eleitoral de Pedro Taques para governador do Estado, foi paga por meio de propina no valor de R$ 12 milhões pelo Grupo JBS S/A, para que não fosse “vasculhado” supostos atos ilícitos de sua gestão.
Na delação, Silval destacou que soube que em 2014, meses antes da eleição para governador, havia um crédito de R$ 12 milhões em face do Grupo JBS, de valores devidos de propina dos anos de 2013 e 2014, sendo que nesse período estavam na pré-campanha para gestor do Estado.
Ele explicou que combinou com o ex-governador e atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi e o ex-prefeito de Cuiabá (que na época era coordenador de campanha de Taques), que auxiliaria financeiramente na campanha do atual governador de maneira oculta, “tendo em vista que oficialmente estava apoiando Lúdio Cabral.
A ajuda foi necessária, de acordo com Silval, já que ele e Maggi estavam preocupados com o fato de Pedro Taques começar a investigar irregularidades ocorridas em seus governos.
Foi assim que o então governador combinou com Mauro que assumiria o compromisso de doar o montante para a campanha de Taques.
Após alguns dias, de acordo com o delator, ocorreu uma alteração no coordenador financeiro da campanha de Taques, assumindo o empresário Alan Malouf no lugar de Mendes, “tendo o declarante combinado com Alan que honraria o compromisso assumido com Mauro Mendes”.
“Off-shore - campanha senador"
Silval relatou que durante a campanha eleitoral, ele decidiu repassar as propinas recebidas pela JBS, para a campanha de Pedro, tendo ele e Nadaf se reunido com o proprietário da empresa, Wesley Batista, em São Paulo, quando disse que queria utilizar de R$ 4 milhões dos “retornos” para “ajudar” Taques.
Wesley então concordou e teria dito que já havia ajudado Taques para a campanha ao Senado com valores através de uma “off-shore”, contudo, antes de realizar o pagamento, Wesley queria conversar com Taques para que o esquema “ficasse bem armado”.
“Após tal reunião Pedro Nadaf, juntamente com Alan Malouf (coordenador da campanha de Pedro Taques) foram até a sede do Grupo JBS S/A, em São Paulo, para tratar do assunto com Wesley Batista, restando definido na reunião que Wesley Batista viria até a cidade de Cuiabá para conversar pessoalmente com Pedro Taques, tendo Pedro Nadaf informado ao Declarante, posteriormente, que tal encontro teria ocorrido; Que o Declarante acredita que o valor de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) tenha sido pago, pois o crédito do Declarante perante Wesley de R$ 12.000.000,00 (doze milhões de reais) passou a ser R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais)”.
Início do esquema
Silval informou que após assumir o governo do Estado em 2010, soube da troca na presidência da JBS, assumindo Wesley no lugar do seu irmão Joesley Batista. A partir desse momento até 2014, conforme o delator, passou a tratar sobre a relação da empresa com o Estado, inclusive sobre recebimento de propinas com Wesley.
Silval contou que em 2010, ele e Pedro Nadaf, então secretário da Secretaria da Indústria e Comércio, Minas e Energia (Sicme), visitaram Joesley, na sede da JBS em São Paulo, visando pedir ajuda financeira para a campanha eleitoral daquele ano, já que a JBS tinha várias plantas frigoríficas em Mato Grosso e também por ser uma empresa “de grande capacidade financeira”.
Declarante se recorda que nessa conversa com Joesley Batista, o Declarante pediu' ajuda' para a campanha eleitoral do ano de 2010, se comprometendo ainda nessa ocasião com o Presidente do grupo em auxiliar a empresa no Estado de Mato Grosso nas questões tributárias em contrapartida ao aporte financeiro da campanha eleitoral
“Declarante se recorda que nessa conversa com Joesley Batista, o Declarante pediu' ajuda' para a campanha eleitoral do ano de 2010, se comprometendo ainda nessa ocasião com o Presidente do grupo em auxiliar a empresa no Estado de Mato Grosso nas questões tributárias em contrapartida ao aporte financeiro da campanha eleitoral”, diz trecho da delação.
Na época, o presidente da JBS concordou com o pedido, se comprometendo em efetuar doação na campanha de 2010 do valor de R$ 3 milhões, “sabendo que as doações foram executadas através de caixa não oficial, no entanto, não se recorda o valor exato”.
Já em 2011, o colaborador explicou que se reuniu com Wesley Batista, momento em que ficou acertado que o Grupo JBS pagaria propinas anuais à Silval para auxiliar nos pagamentos de despesas remanescentes da campanha eleitoral, assim como outros compromissos políticos assumidos. Em contrapartida, a empresa receberia benefícios fiscais do Estado.
Frigoríficos beneficiados
Barbosa ainda expôs em sua delação, que além da JBS, também foram beneficiados outros frigoríficos como Frialto, Marfrig, um frigorífico em Rondonópolis e Redentor.
De acordo com ele, as tratativas com cada frigorífico foram individualizadas, sendo todas tratadas por Nadaf.
Dívida na AL
Em 2011, conforme depoimento de Silval, ele teria assumido uma dívida da Assembleia Legislativa em torno de R$ 7 milhões que a Casa de Leis tinha com o empresário Avilmar Araújo.
Na época, o então presidente da AL, José Geraldo Riva, solicitou lhe pediu auxílio para quitar o débito, lhe sugerindo que encontrasse uma empresa para solicitar um empréstimo junto ao Banco Rural, com conta dos juros menores.
Posteriormente, Riva falou a Silval sobre o empresário Cleudevaldo Birtche, vulgo “Tucura”, dono da Agropecuária Carolmila Ltda.
“Que o Declarante se reuniu com "Tucura" e solicitou que fosse feito esse empréstimo em nome de urna de suas empresas a fim de auxiliar o Declarante e José Riva no pagamento de urna dívida, o que foi aceito pelo empresário; Que o Declarante à época chegou a se reunir com Wesley Batista do Grupo JBS em um restaurante em São Paulo-SP, onde informou a ele sobre a existência dessa dívida perante 'Tucura" e a possibilidade de ela ser quitada diretamente pela JBS; Que essa situação foi o segundo "retorno" que a empresa JBS fez em favor do Declarante”.
Wesley então concordou em fazer o pagamento, já que conhecia Tucura por ser do mesmo segmento de frigorífico.
A dívida então foi paga por meio do “retorno” da JBS em 2013, “tendo Wesley acertado diretamente com ‘Tucura’ e somente avisou ao Declarante que o empréstimo já estava resolvido”.
No ano de 2012, o ex-governador narrou que pagou uma dívida de R$ 7 milhões que tinha com os operadores financeiros Francisco Carlos Ferres, conhecido como “Chico Badotti” e Valdecir Piran, vulgo “Kuki”, com as propinas recebidas pela empresa dos irmãos Batista.
Pagamento para Trimec
Que entre 2012 e 2013, de acordo com o delator, foram repassados a quantia de R$ 10 milhões em propina da JBS e Marfrig para a Trimec Construções e Terraplanagem Ltda, empresa do Wanderley Fachetti Torres.
“(...) a maior quantia proporcionalmente foi paga pela empresa JBS, não sabendo o Declarante precisar exatamente o quanto foi paga por cada urna, pois quem tinha o controle era Pedro Nadaf”.
A ideia de receber propinas por meio da Trimec foi dada por Nadaf, que conforme Silval, só ficou sabendo do esquema, já durante a sua execução.
Em seu depoimento Silval Barbosa afirmou que em uma de suas viagens a São Paulo, entre os anos de 2013 e 2014, foi na sede da JBS para receber parte de uma propina de R$ 500 mil em dinheiro.
Empréstimo para obras do viaduto do Tijucal
Silval também contou que emprestou R$ 1 milhão, referente ao “retorno” da JBS ao empresário João da Enpa, dono da Enpa Construtora, responsável pela construção do viaduto do Tijucal, em Cuiabá. O empresário teria pedido ajuda ao ex-governador para dar continuidade as obras do viaduto.
“Que o empresário João 'Da Enpa' estava com dificuldades financeiras para dar continuidade a obra do Viaduto do Tijucal e pediu ao Declarante que apresentasse alguém que pudesse emprestar dinheiro para finalizar a obra ou para tocar a obra; Que o Declarante decidiu emprestar o valor de R$ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil reais) para que o empresário concluísse a obra; Que até o momento, João ‘da Enpa’ somente pagou os juros, tendo urna diferença ainda a ser acertada com o Declarante”, explicou.
Dívida com Defanti
Silval Barbosa contou que em 2015 precisava quitar alguns compromissos sendo que um deles era uma dívida de R$ 2 milhões que ele tinha com o Dalmi Defanti, um dos donos da Gráfica Defanti. O débito, de acordo com o delator, era oriundo de campanha eleitoral de 2014.
Desta forma, ele teria pedido a Pedro Nadaf, que conversasse com Wesley para receber parte das propinas que estavam pendentes, combinando o recebimento de R$ 4 milhões em espécie.
O dono da JBS pediu para que o encontro com Nadaf seria no Rio de Janeiro. Após definir o local para o encontro, Nadaf teria ligado para o então procurador do Estado, Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, o Chico Lima, para que ele fosse encontrar com o proprietário da JBS.
Chico Lima então acatou o pedido, tendo recebido R$ 200 mil por “gratificação”.
Silval pediu a Chico que fosse feito um depósito de R$ 100 mil para um posto de combustível de seu irmão, referente a uma dívida de óleo diesel consumido em sua fazenda.
O ex-governador ressaltou que com o “retorno” também pagou a dívida de R$ 800 mil que ele tinha com Dalmi Defanti, além de ter usado R$ 70 mil para quitar parte de honorários advocatícios a seu advogado, sobre a ação civil pública do caso JBS, “tendo o restante do valor o Declarante pedido para "Chico Lima" repassar a Pedro Nadaf”.
“Pedro Nadaf recebeu uma 'gratificação' sobre valor dos incentivos, uma média de 15%, e o restante aproximadamente, de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) ficou com Pedro Nadaf para pagar compromissos do Declarante durante o ano de 2015; Que o Declarante informa que Pedro Nadaf ficou para si com um percentual de 15% das propinas recebidas pela JBS S/A, sendo que nas oportunidades em que conversava com Wesley Batista sobre os pagamentos de propina, Wesley tinha controle de tudo que foi pago para o Declarante, não se recordando se fez mais algum pagamento de dívidas através da JBS S/A, mas que Pedro Nadaf pode ter operados os recebimentos”, diz outro trecho do acordo de colaboração premiada.
Ação civil pública
Ele ainda revelou que benefícios fiscais concedidos ao Grupo JBS em 2012 foi por meio de decreto e que a empresa foi favorecida com crédito e incentivos cujo detalhes foi tratado sempre com Nadaf.
Entretanto, embora tenha sido editado um decreto, Silval revelou que houve uma autuação em desfavor da JBS pela Secretaria de Fazenda, visto que a equipe de fiscalização discordava da forma de compensação de créditos. Com a situação, Nadaf teria “cobrado” Marcel de Cursi para dar providências ao caso.
Contudo, Marcel não “resolveu” o problema, tendo ensejado em uma ação civil pública em 2014, contra Nadaf, Curso, Edmilson José dos Santos e a JBS, momento em que foi bloqueado o montante de R$ 73 milhões da empresa e dos demais.
“(...) Marcel de Cursi nformou que tentaria resolver a situação, dizendo posteriormente que os Responsáveis pela autuação tinham autonomia e que não conseguiu reverter; Que essa autuação fiscal gerou uma ação civil pública no ano de 2014 constando do seu pólo passivo o Declarante, Pedro Nadaf, Marcel Cursi, Edmilson José dos Santos e representantes do GRUPO JBS S/A, tendo sido bloqueado o montante de R$ 73.000.000,00 (setenta e três milhões de reais) do GRUPO JBS S/A e dos demais Demandados”.
Segundo Silval, ele foi procurado por Wesley Batista no Palácio Paiaguás, momento em que o dono da JBS estava “irado” com a ação, “tendo tecido duras críticas” ao então governador e secretários, “haja vista que estava quitando as propinas e estava tendo entreveros no Estado de Mato Grosso”.
Nessa reunião, ficou definido que Nadaf solucionaria o problema juntamente com o jurídico da empresa.
Ainda em 2014, Pedro levou um documento para Silval assinar, “dizendo ser a solução para a ação civil pública”. Esse documento teria inserido a JBS dentro do Prodeic, “e que essa era a solução apresentada por Pedro Nadaf”.