A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se manifestou favorável ao acórdão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT) que cassou o mandato da senadora Selma Arruda, por abuso de poder econômico e uso de “caixa 2” e a realização de novas eleições.
O parecer foi encaminhado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde tramita os recursos ordinários contra e a favor da cassação.
Dodge, ao longo da manifestação, frisou que as informações e provas dos autos demonstram com “clareza suficiente” que a senadora praticou os crimes de captação e gastos ilícitos de recursos financeiros e abuso de poder econômico nas eleições passadas.
Ela citou que o empréstimo tomado por Selma junto ao seu suplente, no valor de R$ 1,5 milhão, que foi usado para financiar a contratação de serviços eleitorais, leva “à conclusão de que mencionado instrumento contratual apenas foi erigido com o intuito de convalidar a ilicitude que, desde o nascedouro, impregnava a captação de recursos”.
A procuradora destacou que a então candidata não tinha patrimônio suficiente para adimplir o empréstimo, o que, para ela, reforça ainda mais o fato de que o contrato foi simulado para ocultar a verdadeira origem do dinheiro.
Ainda que se defenda que a soma dos valores das campanhas oficial e paralela não tenha extrapolado o limite fixado no estado do Mato Grosso para gastos para a eleição ao Senado, não se pode perder de vista que os recursos não contabilizados se prestaram à antecipação da campanha dos recorrentes, por meio da produção de material publicitário, ações de marketing, realização de pesquisas, contratação de pessoal de campanha, tudo isso antes do período eleitoral
“Portanto, não deve prevalecer o argumento, tantas vezes suscitado pelos recorrentes, de que inexiste demonstração suficiente, segura e robusta do nexo causal entre as despesas realizadas pela candidata eleita e a campanha eleitoral".
“Ciente de que os pagamentos foram realizados justamente de modo a enrustir o verdadeiro fluxo monetário, não é de se esperar que do acervo probatório aflorem evidências diretas e explícitas do cometimento do ilícito, como pretendem e insistem os recorrentes".
Raquel Dodge também ressaltou a contratação milionária feita pela parlamentar junto a agência Genius at Work Produções Cinematográficas Ltda para confecção de materiais eleitorais, antes do período permitido pela Justiça.
“Em verdade, o fato de os candidatos não terem lançado mão desses produtos não desnatura a feição eleitoral de que se revestem, pois, nos termos do que prescreve o § 1º, do art. 38, da Resolução TSE nº 23.553/2017, “os gastos eleitorais efetivam-se na data de sua contratação”.
“Nesse contexto, não prospera a alegação dos recorrentes de que a captação de recursos tida por irregular (“caixa dois”), mormente no que atine aos gastos realizados em momento anterior ao início do processo eleitoral e omitidos da prestação de contas, não teriam trazido desequilíbrio ao pleito”.
O parecer ainda destacou que o importe de mais de R$ 855 mil utilizados antes da campanha prejudicou o pleito eleitoral.
“Ainda que se defenda que a soma dos valores das campanhas oficial e paralela não tenha extrapolado o limite fixado no estado do Mato Grosso para gastos para a eleição ao Senado, não se pode perder de vista que os recursos não contabilizados se prestaram à antecipação da campanha dos recorrentes, por meio da produção de material publicitário, ações de marketing, realização de pesquisas, contratação de pessoal de campanha, tudo isso antes do período eleitoral”.
“Tratou-se, em verdade, de vantagem considerável para os recorrentes dentro da disputa, na medida em que dispunham de elevada expressão monetária antes do período eleitoral, que foram utilizados para o pagamento de gastos eleitorais realizados antes daquele momento e também no curso da corrida eleitoral”, completou.
Suposta venda de suplente e substituição da senadora
A procuradora ainda se manifestou sobre o recurso movido pelo grupo por Carlos Fávaro (ex-candidato ao Senado Federal), Geraldo de Souza Macedo, José Esteves de Lacerda Filho e o Diretório Regional do Partido Social Democrático (PSD).
Ela se posicionou contra ao pedido de análise da suposta venda de suplente por parte de Arruda a Possamai. Segundo Dodge, a indagação trata-se de inovação recurso, pois foi “ventilado” somente no recurso ordinário e não analisado anteriormente pelo TRE.
No parecer, a procuradora ainda se coloca contra a substituição da senadora por Fávaro, uma vez que não há dispositivo legal prevendo tal autorização.
Por isso, deve ser realizado novas eleições, como determinou o TRE. Quanto à isso, ao final do documento, Dodge pediu para que o TSE para que mantenha a cassação e, assim que publicado o acórdão, seja realizado novo pleito, independentemente de eventuais embargos declaratórios.
O caso
Em abril deste ano, o TRE-MT, por unanimidade, cassou o mandato de Selma e de seus suplentes, Gilberto Eglair Possamai e Clérie Fabiana Mendes, por uso de caixa 2 e abuso de poder econômico praticados nas eleições passadas.
Arruda e Possamai ainda foram declarados inelegíveis por oito anos.
Para o TRE, ficou comprovado que a senadora efetuou gastos acima do permitido, o que teria prejudicado o resultado do pleito, bem como pagou por despesas acima de R$ 1,2 milhão com dinheiro paralelo a conta bancária oficial, gerando o caixa 2.
Além de cassar o mandato de Arruda, o tribunal ainda determinou a realização de novas eleições, para que seja eleito um novo substituto para o cargo.
Inconformada, a senadora entrou com embargos de declaração no próprio TRE questionando a decisão condenatória.
O recurso foi apreciado no final de julho passado, quando a Corte Eleitoral admitiu parcialmente os embargos, apenas para que fosse reconhecido a fraude em um cheque que consta na AIJE.
Os demais erros que a defesa da senadora apontou nos embargos não foram acolhidos pelo TRE, o que fez manter a cassação de Selma.
Posteriormente, Arruda recorreu ao TSE. Além dela, também apresentaram recursos ordinários: Gilberto Eglair Possamai, Clérie Fabiana Mendes e o Partido Social Liberal (PSL), que pedem o afastamento de todas as sanções impostas pelo TRE-MT.
Há ainda o recurso interposto por Carlos Fávaro (ex-candidato ao Senado Federal), Geraldo de Souza Macedo, José Esteves de Lacerda Filho e pelo Diretório Regional do Partido Social Democrático (PSD). Estes requerem manter a cassação, mas pedem para que a senadora seja substituída por Fávaro, já que este foi o segundo mais votado e ainda a condenação de Arruda por suposta venda da suplência a Possamai.
VEJA A ÍNTEGRA DO PARECER DA PGR