O juiz Bruno D’Oliveira Marques, da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular, negou o pedido do Ministério Público Estadual (MPE) e deixou de decretar o bloqueio de R$ 11,7 milhões dos ex-secretários Éder de Moraes e Edmilson José dos Santos, dos procuradores do Estado João Virgílio do Nascimento Sobrinho e Dorgival Veras de Carvalho e de outros.
Eles, além do servidor João Carlos Simoni e a Cohabita Construções Ltda, foram alvos de uma ação civil pública do MPE, que apontou um suposto esquema que efetivou o pagamento de uma dívida prescrita do Estado com a DM Construtora Ltda, com valor acima do que era devido.
A denúncia relatou que os procuradores do Estado foram fundamentais para o esquema, já que teriam dado pareceres favoráveis ao pagamento supostamente indevido.
Ao analisar o caso, o juiz afirmou que não foi possível extrair a existência de indícios robustos que pudessem levar ao deferimento do pedido liminar.
“Isso porque as condutas ímprobas supostamente cometidas estariam relacionadas à atuação de Procuradores do Estado no exercício de atividades típicas de tal função, que é a emissão de pareceres jurídicos em procedimentos administrativos de interesse do ente estatal”, frisou.
Diante do entendimento supramencionado, a conclusão acerca da existência de indícios suficientes a autorizar a cautelar de indisponibilidade dependeria de maior incursão nos elementos de prova, já que da leitura dos pareceres não é possível verificar, prima facie, que os apontamentos neles feitos sejam flagrantemente equivocados ou contenham erros grosseiros, a evidenciar terem sido elaborados dolosamente
Ele esclareceu que, conforme entendimento de Tribunais Superiores, o pedido liminar só é aceito em situações excepcionais e que seria imprescindível a demonstração de que os pareceres dados pelos procuradores foram elaborados dolosamente com a intenção de viabilizar o ato ilícito.
“Diante do entendimento supramencionado, a conclusão acerca da existência de indícios suficientes a autorizar a cautelar de indisponibilidade dependeria de maior incursão nos elementos de prova, já que da leitura dos pareceres não é possível verificar, prima facie, que os apontamentos neles feitos sejam flagrantemente equivocados ou contenham erros grosseiros, a evidenciar terem sido elaborados dolosamente”, continuou o magistrado.
Marques ainda reforçou que na atual fase processual ainda não é possível definir a relação de causalidade entre os pareceres e o ato administrativo que teria causado o rombo nos cofres estaduais.
Prescrição
A prescrição dos atos denunciados pelo Ministério Público também foi um dos fatores citados pelo magistrado que impediu o bloqueio de bens dos acionados.
“Além disso, no que tange a conduta dos demais agentes públicos, ressalto que, em razão da prescrição dos atos de improbidade - o procedimento preparatório instaurado pelo autor perdurou por lapso superior ao prescricional -, a responsabilidade prende-se à demonstração de que o pagamento foi indevido, o que se revela inviável nessa fase de cognição sumária”.
Manifestação
Ao final, o juiz determinou que as partes rés se manifestem no prazo de 15 dias.
O procurador-geral do Estado, Francisco Lopes, também deve apresentar manifestação sobre a ação pelo mesmo prazo.
Suposto esquema
Segundo a ação civil pública, que é fruto de um inquérito que investigou fatos delatados pelo empresário Junior Mendonça – que foram, inclusive, confirmados por Éder Moraes –, havia um esquema ilícito conduzido pelos denunciados no qual o Estado pagava dívidas antigas de determinadas empresas, algumas até indevidas e outras prescritas, com cálculos inflacionados, para, apenas, obter retorno indevido em favor do grupo criminoso, que usava o dinheiro desviado para adimplir empréstimos obtidos por Júnior Mendonça.
Nesse caso, o Estado, por meio do Departamento de Estradas e Rodagem (Dermat), firmou contrato com a DM Construtora de Obras Ltda, para execução da implantação da Rodovia MT 480 (trecho Tangará da Serra - Deciolância). Entretanto, o governo não teria efetuado o pagamento referente às 10ª e 11ª mediações de dezembro de 1994, nos valores originais de R$ R$ 999.934,01 e R$ 139.973,12 respectivamente, supostamente devidos e cujo crédito foi cedido para a empresa Cohabita Construções Ltda, em outubro de 2009.
Segundo a denúncia, os pedidos de pagamento originários eram datados de 2002 e 2003 e se referiam a créditos com mais de oito anos, sendo certo que esses pedidos ficaram parados por vários anos. Somente em 2009, cerca de seis anos depois, no mesmo ano da cessão do crédito, é que o processo administrativo teve seu andamento retomado.
Conforme a ação, o trâmite do processo foi extremamente célere. A Secretaria de Estado de Fazenda, então administrativa por Éder, fez o cálculo da dívida com atualização monetária.
O valor, após ter sido “inflado”, foi encaminhado ao procurador-geral Dorgival Veras, que analisou o caso e encaminhou para solicitação de pagamento à procuradora do Estado, Gláucia do Amaral. Esta, por sua vez, emitiu parecer pela improcedência do pedido, uma vez que não havia pagamento a ser feito à DM Construtora dada a ocorrência da prescrição.
O parecer de Amaral foi desentranhado e afastado o fenômeno da prescrição por determinação de João Virgílio, que contribuiu para que o pagamento fosse aprovado.
Logo após, a empresa DM Construtora cedeu seu crédito à Cohabita, por meio de seu procurador João Simoni.
“Tudo ocorreu de forma muito estranha porque o pedido da DM Construtora já estaria na fase final de pagamento e, logo em seguida foi cedido o crédito para a requerida Cohabita, conforme escritura pública (...). No mesmo dia da escritura o requerido João Simoni, ainda como procurador da empresa DM Construtora indicou a conta da empresa requerida Cohabita, de quem também era procurador, para a realização do pagamento (...). Intrigante também o fato de que o requerido João Simoni na escritura de cessão de crédito (...) figurou como procurador de ambas as empresas”, destacou o MPE.
“Para completar a maracutaia e efetivar o saque de dinheiro público o requerido Éder Moraes, então Secretário de Estado de Fazenda autorizou por decisão administrativa (...) o pagamento de R$ 11.461.591,76 (onze milhões, quatrocentos e sessenta e um mil, quinhentos e noventa e um reais e setenta e seis centavos). A empresa deu quitação (...), com posterior e efetiva liquidação e pagamento através de ordem bancária (...), esta providenciada pelo requerido Edmilson José dos Santos, que era o ordenador de despesa, tudo feito em tempo recorde, seguindo cálculo forjado na PGE pelo requerido Ormindo, a pedido dos requeridos Procuradores do Estado. Acrescento que a empresa DM Construtora parece ter cedido seu suposto crédito à empresa requerida Cohabita, no mesmo dia em que o pagamento foi autorizado e, ao que tudo consta, a título gratuito”.
Ao final, o MPE pediu que a Justiça condene os acionados à devolução de R$ 11.794.631,00 ou, pelo ao menos, o ressarcimento de R$ 3,7 milhões, montante que foi adicionado no valor da dívida.
CONFIRA ABAIXO A DECISÃO