Por unanimidade, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT) acolheu, em parte, os embargos de declaração movidos pela senadora Selma Arruda contra a decisão que cassou seu mandato.
Apesar de ter deferido um dos pedidos da defesa – apenas para reconhecer um documento fraudado que consta na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) –, o recurso não teve efeitos infringentes, ou seja, não reformou a decisão e a senadora segue com o diploma cassado por abuso de poder econômico e uso de caixa 2 nas eleições passadas.
A análise do recurso foi feita durante a sessão plenária desta quinta-feira (25).
Nos embargos declaratórios, a defesa elencou que o acórdão que puniu Arruda e seus suplentes contém vícios, omissões, contradições e falta de fundamentação.
As teses suscitadas foram, em sua maioria, rejeitadas pelo relator do caso, desembargador Sebastião Barbosa Farias.
O voto do relator foi acompanhado pelo presidente do TRE, desembargador Gilberto Giraldelli, pelos juízes membros Vanessa Curti Gasques, Jackson Coutinho, Antônio Peleja Júnior, Yale Sabo Mendes e Sebastião Monteiro.
Selma poderá recorrer no Tribunal Superior Eleitoral, que decidirá se mantém ou não a cassação.
Questão de ordem
Antes de iniciar a análise do recurso, a defesa de Selma levantou uma questão de ordem pedindo para adiar o julgamento dos embargos, uma vez que o processo de prestação de contas não se encontra com trânsito em julgado e que alguns elementos dele fazem parte do conteúdo da ação; que a ação monitória do contrato firmado entre Selma e a agência Genius não foi julgada, não podendo ser incluso como prova na AIJE; e que a defesa não teve oportunidade de se manifestar sobre a carta precatória referente a oitiva da testemunha.
O representante da Procuradoria Regional Eleitoral, procurador Pedro Melo Pouchain, deu parecer pela improcedência do requerimento, uma vez que as questões arguidas já foram decididas e que não há prejuízo algum para parte que poderia ensejar a suspensão do julgamento.
O desembargador Sebastião Barbosa Farias destacou que a questão “é mais do mesmo” e que é sempre citada, para que se arraste o julgamento do caso. Por isso negou, sendo seguido pela maioria do Pleno.
Julgamento sem conclusão da instrução
O desembargador refutou os argumentos da defesa, de que houve irregularidades na decisão questionada, já que não foi fundamentada uma vez que foi aberto prazo para as partes apresentarem as alegações finais, mesmo sem a conclusão da oitiva em que seria ouvida uma testemunha em Brasília sobre o caso.
Para o magistrado, o relator anterior do caso já havia analisado e negado o pedido. Ele lembrou que a Corte decidiu que a expedição da carta precatória sobre a oitiva não tem força para suspender o julgamento e que a defesa deixou de explicar a imprescindibilidade do colhimento do depoimento da testemunha.
“Deveras, não se verifica qualquer omissão ao tema. O relator citou a irrelevância da prova e ponderou que a expedição da carta precatória não tem condão de suspender o julgamento. Concluiu o julgador que o prejuízo só ficaria caracterizado se a testemunha fosse imprescindível, o que não foi demonstrado pelos embargados”, disse Farias.
“Os investigados não comprovaram que a oitiva era imprescindível para o deslinde da causa. Não alegaram e tão pouco justificaram a necessidade da prova requerida, apenas aduziram que a instrução não poderia ser encerrada. Logo, não há omissão a ser sanada”, completou.
A defesa frisou que o relator da AIJE na época não expôs sobre as alegações que haviam sido levantados por ela. Mas, o desembargador Sebastião Barbosa lembrou que o julgador não é obrigado a rebater cada um dos argumentos da defesa no julgamento do processo.
O que se vê é que não houve omissão ou obscuridade, pois o fato da fundamentação do julgado não coincidir a tese defendida pela parte, não implica omissão
Caixa 2
O relator também analisou a tese de que a senadora não extrapolou os limites de custos de candidato médio e que os gastos “vultuosos” citados no processo não teriam qualquer relação com a campanha eleitoral. Para Farias, não cabe rediscussão da matéria e que os embargos não é a via idônea para reverter a cassação.
Ele lembrou que Selma, antes de ser candidata ao Senado, realizou gastos eleitorais, que não foram registrados na conta oficial de campanha, configurando o crime de caixa 2.
“Tais valores somados perfazem o expressivo montante R$ 1,2 milhão de gastos em qualquer registro, além de extrapolar o limite, configura a prática ilegal de caixa 2, inviável acolhimento da tese dos embargantes”.
O relator considerou que as eventuais omissões e contradições foram levantadas pela defesa para abordar o mérito do caso, o que é inadmissível.
“A defesa usa de supostas omissões e contradições que não existem na tentativa de resolver o tema de fundo. O que se vê é que não houve omissão ou obscuridade, pois o fato da fundamentação do julgado não coincidir a tese defendida pela parte, não implica omissão”, frisou.
Jingle
A defesa também destacou que a senadora desembolsou o custo para confeccionar um “jingle” que foi usado para evento intrapartidário, mas que não o utilizou na campanha. Por isso, deveria o acórdão do TRE ser revisto nesse ponto. Entretanto, o relator rejeitou.
“Assim, o teor do conteúdo da mídia ou como foi utilizado pouco importa para o deslinde da causa, uma vez que ainda não tenha sido utilizada em momento algum não desnatura o fato de que foi gasto de pré-campanha não contabilizado, logo, não um gasto pessoal”.
Cheque fraudado
Sebastião Barbosa Farias apenas acolheu o argumento da defesa para reconhecer que um cheque no valor de R$ 29 mil, supostamente emitido pelo primeiro suplemente de Selma, Gilberto Eglair Possamai, foi fraudado.
“Nesse ponto, assiste razão aos embargantes. O documento levado em consideração é falso, sendo que a confirmação é de fácil aferição”, disse o magistrado, que reforçou que o acolhimento do pedido não diminui a sanção imposta à Selma e seus suplementes, o que mantém intacto o mérito do acórdão questionado.
Empréstimo milionário
Selma também tentou reverter os efeitos que o empréstimo, no valor de R$ 1,2 milhão, tomado junto à Possamai teve na sua cassação. De acordo com a defesa, a decisão do TRE não tem qualquer fundamentação fática e jurídica que contradiz a licitude do empréstimo.
O pretexto foi negado pelo relator.
Contrato com a Genius e ação monitória
A defesa de Selma pretendia reformar a decisão quanto a utilização do contrato firmado entre a senadora com a agência de publicidade Genius, entabulado antes do período eleitoral, como prova nos autos. De acordo com os defensores de Arruda, a ação monitória ajuizada na Justiça que questiona o contrato ainda não foi julgada e, por isso, não deveria o contrato não pode respaldar a AIJE.
Farias rechaçou a justificativa e reforçou que a prova emprestada de outros autos é permitida desde que garanta o contraditório. Portanto, rejeitou o pedido.
Preocupação dos juízes
Apesar de ter acompanhado a íntegra o voto do relator, o juiz Yale Mendes deixou claro quanto à sua preocupação em relação à realização do julgamento do caso, sem a conclusão da oitiva da testemunha.
“Nós, como juízes de primeiro grau, é costume esperarmos a carta precatória para julgar o processo. Acredito que é certo que isso terá que ser debatido no TSE. Acho que deveria ser dado vista aos autos dessa precatória as partes para que se manifestassem”, disse o magistrado.
Ao votar para negar o recurso, o desembargador Gilberto Giraldelli fez uma ressalva e disse que não se pode concluir que o cheque, no valor de R$ 29 mil, foi falsificado, sem que haja um inquérito policial que certifique a fraude. Contudo, disse que o TSE deve analisar melhor essa questão e seguiu o entendimento do relator.
Entenda o caso
Em abril deste ano, o TRE-MT, por unanimidade, cassou o mandato de Selma e de seus suplentes, Gilberto Eglair Possamai e Clérie Fabiana Mendes, por uso de caixa 2 e abuso de poder econômico nas últimas eleições.
Arruda e Possamai ainda foram declarados inelegíveis por oito anos.
Para o TRE, ficou comprovado que a senadora efetuou gastos acima do permitido, o que teria prejudicado o resultado do pleito, bem como pagou por despesas acima de R$ 1,2 milhão com dinheiro paralelo a conta bancária oficial, gerando o caixa 2.
Além de cassar o mandato de Arruda, o tribunal ainda determinou a realização de novas eleições, para que seja eleito um novo substituto para o cargo.
Inconformada, a senadora entrou com embargos de declaração no próprio TRE questionando a decisão condenatória. O recurso foi apreciado nesta quinta-feira (25), tendo parcial acolhimento.
ASSISTA ABAIXO O JULGAMENTO NA ÍNTEGRA: