Em razão dos últimos acontecimentos noticiados pela imprensa estadual, nos vemos no dever de tecer alguns comentários sobre o princípio da imparcialidade do juiz que na maioria dos casos não há como ser assegurado, diante do próprio magistrado ser membro daquela sociedade em que supostamente houve a pratica de crimes pelo acusado.
Destacamos inicialmente o art. 8º, item 1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos que está em vigor desde 1992, a saber:
“Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer natureza.”
Sendo certo que o Tratado Internacional supracitado foi recepcionado pelo Decreto 678/92, ficando regulamentado o princípio da imparcialidade do juiz no ordenamento jurídico brasileiro, bem como implicitamente está previsto na Constituição Federal no art. 5º, § 2º.
Como se sabe a persecução penal é formada por duas fases, sendo que na primeira ocorre o chamado inquérito policial, ao passo que na segunda tem-se o processo penal em si.
Especificamente na segunda fase do procedimento criminal brasileiro, temos como regra geral que o Ministério Público é o responsável pela acusação nas ações penais, tendo, portanto, legitimidade ativa para fazê-lo.
Entrementes, diferentemente do que determina o princípio, alguns juízes têm agido de maneira diversa, assumindo o posto de acusação nos processos penais, violando diretamente o princípio da imparcialidade do juiz, senão vejamos os ensinamentos do professor Guilherme de Souza Nucci:
“[...] por mais cautela que se tenha na elaboração de leis, épossível que um determinado caso chegue às mãos de magistrado parcial. Essa falta de isenção pode decorrer de fatores variados: corrupção, amizade íntima ou inimizade capital com alguma das partes, ligação com o objeto do processo, conhecimento pessoal sobre o fato a ser julgado etc.”
Acertadamente Nucci lembra em outras palavras que os magistrados também são seres humanos e podem se tornar parciais em casos específicos, principalmente naqueles de maior repercussão na sociedade, além de que podem possuir uma formação moral, psíquica e religiosa que não coaduna com a conduta do acusado.
Em que pese situações como essas possam ocorrer, o magistrado à luz dos artigos 252 a 254 do Código de Processo Penal, deveria se declarar suspeito ou impedido conforme o caso que encontra em mãos, todavia não é que se vê no dia a dia dos processos criminais, de modo que inúmeras vezes os advogados devem arguir as exceções de suspeição e impedimento para buscar o afastamento do magistrado.
De fato, corretamente agem os advogados criminalistas que devem defender os direitos de seus clientes serem julgados de maneira parcial, contudo, os magistrados ao não se declararem parciais naquela situação específica acabam por futuramente frustrar o andamento de todo o processo, que não raro é moroso e complexo, por uma eventual nulidade que possa ser arguida pela defesa.
O que fica claro é o cumprimento do papel da advocacia em demonstrar os direitos de seus clientes, lutando sempre para garantir o respeito e a ordem a luz da legislação, o cumprimento do papel do magistrado em verificar conflitos, e/ou analisar o descumprimento da legislação devem sempre estar amparado pela imparcialidade no caso concreto.
Augusto Bouret Orro é advogado no escritório Bouret Orro Advocacia e Consultoria Jurídica e pós-graduando em Ciências Criminais.
Wilson Alves de Lima Filho é Controller Jurídico no escritório Bouret Orro Advocacia e Consultoria Jurídica.