Lucielly Melo
O juiz Yale Sabo Mendes, da Sétima Vara Cível de Cuiabá, mandou confiscar R$ R$ 805.902,00 em bens da bióloga Rafaela Screnci da Costa Ribeiro, acusada de atropelar e matar o cantor Ramon Alcides Viveiros.
A decisão do magistrado, deferida nesta terça-feira (4), consta nos autos de uma ação de reparação de danos morais e materiais movida pela família de Ramon – que é filho do procurador aposentando do Ministério Público Estadual (MPE), Mauro Viveiros.
Além de Rafaela, também foi processado seu pai, Manoel Randolfo da Costa Ribeiro, uma vez que é dono do carro conduzido pela acusada na ocasião do acidente.
Na decisão, o juiz frisou que “aos olhos do senso comum, a indenização perseguida na presente demanda judicial, seja pelo estreito vínculo existente entre genitores e irmãos, como também, pela forma brutal e inesperada com que a vítima veio a óbito, faz presumir indubitavelmente que seu falecimento causou indizível dor, angústia e sofrimento aos Autores, daí porque os danos morais, no caso, são inequívocos e o direito de serem ressarcidos é patente”.
Por conta disso, ele entendeu que há a necessidade de constituir verba e, para isso, bens devem ser confiscados pela Justiça, a fim de garantir que o valor indenizatório seja pago à família, em caso de condenação da acusada.
“Nesse sentido, tem-se que, após a sentença de mérito, a formação de capital é obrigatória e independe de risco de dano, ao passo que, em sede de tutela provisória, tal medida seria de natureza cautelar, o que pressupõe a demonstração de probabilidade do direito, além do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo” frisou.
“Nesse passo, comprovada a ocorrência do acidente e subsistindo indícios veementes quanto à responsabilidade dos Requeridos sobre o evento, aliado ainda às gravíssimas circunstancias do caso, pois se trata de morte do filho e irmão dos Requerentes, resta de pronto evidenciado a probabilidade do direito, assim como o perigo de dano e o risco ao resultado útil do processo decorrem do próprio fato, pois o objetivo compensatório da indenização gerado pela responsabilidade civil poderá ser frustrado caso não determinada a formação de capital para o cumprimento da obrigação em caso de eventual condenação”, completou.
Em relação ao valor do requerido pela família da Ramon, o magistrado considerou que “a grandeza da dor causada aos Requerentes”, uma vez que é “evidente e inestimável, impondo-se que as indenizações sejam valoradas à altura, não com o intuito de compensação, já que isso seria impossível, mas para aliviar de certo modo os transtornos vivenciados”.
Yale ainda reforçou que, em caso de absolvição de Rafaela, os bens bloqueados poderão ser devolvidos, com correção monetária.
O acidente
Rafaela Screnci também responde uma ação penal, pela morte de Ramon Viveiros e da jovem Mylena de Lacerda Inocêncio e Ramon Alcides Viveiros.
A acusada também é ré pelo crime homicídio tentado contra Hya Giroto Santos, que também foi vítima e sofreu graves lesões corporais.
Segundo a denúncia, os crimes aconteceram no dia 23 de dezembro de 2018, na Avenida Isaac Povoas, nas proximidades da Valey Pub. Na ocasião, a denunciada atropelou Mylena de Lacerda Inocêncio, Ramon Alcides Viveiros e Hya Giroto Santos, causando a morte das duas primeiras vítimas e gravíssimas lesões corporais na terceira.
Ao dirigir em notório estado de embriaguez e em velocidade acima do permitido, conforme o MPE, a acusada assumiu o risco de produzir o resultado morte.
“Imagens de câmeras instaladas da Boate Malcon, onde a denuncianda estava até poucos momentos antes, mostram que ela cambaleava à porta de um banheiro, com ânsia de vômito. Mesmo naquele estado de embriaguez assumiu a direção do veículo dirigindo-o por cerca de dois quilômetros até o local do crime”, diz um trecho da denúncia.
Ao contrário da conclusão do delegado de polícia, o entendimento do MPE é de que a vítima Hya Girotto Santos não poderia ser denunciada por participação ou coautoria nos crimes, pois não houve vínculo subjetivo (consciência e vontade) entre os participantes.
Segundo o órgão ministerial, ainda que a referida vítima “não teve sequer conhecimento do que a motorista viria a fazer e, portanto, não poderia ter consciência de que colaborava de alguma forma para o evento que vitimou fatalmente a seus dois amigos e causou, em si própria, gravíssimas lesões corporais, as quais felizmente não resultaram na sua morte”.
As imagens captadas em tempo real por câmeras de TV em vias públicas, no dia da ocorrência, segundo o MPE, afastam a possibilidade de participação consciente e voluntária de Hya Girotto. Além disso, o seu comportamento não apresentou semelhança às modalidades de participação previstas no Código Penal (instigação ou induzimento e cumplicidade).
O Ministério Público argumentou, ainda, que a causa determinante dos crimes foi, inegavelmente, a ação da motorista do veículo.
“A circunstância de uma das vítimas, momento antes, ter dançado na pista, é condição que não guarda relação de causalidade com o resultado do ponto de vista penal. Mesmo que aquele dado remoto pudesse participar do processo causal do ponto de vista naturalístico, é inegável que a motorista Rafaela, com o seu comportamento consciente, voluntário e perigoso, provocou um novo nexo de causalidade determinando, por si só, o resultado criminoso, o que excluiria a imputação inicial, como prescreve o art. 13, parágrafo primeiro do Código Penal. O resultado criminoso foi claramente produto exclusivo do risco posterior, não da soma de energias entre o comportamento da vítima e da motorista”, acrescentou.
A denúncia também aponta a sobreposição de indiciamento por parte da autoridade policial. Ressaltou que, ao considerar que a vítima sobrevivente teria contribuído para os crimes culposos, a motorista Rafaela acabou indiciada por crimes de homicídios dolosos e culposos pelos mesmos fatos, o que não é admitido pela Legislação Penal.
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