O juiz Bruno D’Oliveira Marques, da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular, decretou o bloqueio de bens da empresa Pro Nefron Nefrologia e Terapia Renal Substitutiva Ltda, de Carla Maria Vieira de Andrade Lima e de Francisco Gomes de Andrade Neto – estes últimos são, respectivamente, mulher e filho do procurador aposentado do Estado, Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, conhecido como Chico Lima.
A decisão foi dada nesta segunda-feira (20) e consta numa ação civil pública que apura um suposto pagamento de propina para frustrar o processo licitatório do serviço rodoviário intermunicipal de Mato Grosso, na gestão de Silval Barbosa.
A empresa terá R$1.241.483,00 indisponibilizados, Carla Maria, o valor de R$ 324 mil e Francisco Neto, o montante de R$ 640 mil. Somados, os valores chegam a mais de R$ 2,2 milhões.
Também respondem a ação: Chico Lima, Silval Barbosa, Éder Augusto Pinheiro, Júlio César Sales Lima, Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiros do Estado de Mato Grosso (SETROMAT), Verde Transporte Ltda, Empresa Colibri de Transporte Ltda, Viação Sol Nascente Ltda, Viação Eldorado Ltda, Empresa de Transporte Andorinha S/A, Expresso Rubi Ltda, Barratur Transporte e Turismo Ltda, Transporte Jaó Ltda, Viação São Luiz, Viação Xavante Ltda, Rápido Chapadense Viação Ltda, Viação Nagib Saad Ltda e Orion Turismo Ltda.
O juiz acatou o pedido do Ministério Público do Estado, autor da ação, uma vez que há indícios do suposto enriquecimento ilícito e dano ao erário, decorrente da suposta prática de improbidade administrativa apontada nos autos.
Segundo o magistrado, Chico Lima teria recebido os valores decorrentes da vantagem indevida e distribuído entre seus parentes e a empresa do filho.
“Em tese, em relação ao requerido Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, poder-se-ia falar em solidariedade no que tange aos valores acrescidos ilicitamente no patrimônio de Francisco Gomes de Andrade Lima Neto, Carla Maria Vieira Andrade Lima e da empresa Pro Nefron Nefrologia e Terapia Renal Substitutiva Ltda, pois foi ele quem, na aparente condição de mentor do esquema, procedeu à distribuição da vantagem entre seus parentes e empresa de seu filho”.
“Dessa forma, considerando a prova documental acostada aos autos, reputo presente a verossimilhança dos fatos narrados, no sentido da prática pelos requeridos de atos ímprobos que importaram enriquecimento ilícito, razão pela qual entendo cabível o deferimento da indisponibilidade de bens nos limites do envolvimento dos réus narrados na inicial, bem como do valor de possível multa civil a ser eventualmente aplicada como sanção autônoma”.
Apesar de ter sido acionado nos autos, Chico Lima escapou do bloqueio judicial. O juiz chegou a reconhecer que o procurador deveria sofrer a indisponibilidade por solidariedade, uma vez que foi ele quem, supostamente, teria sido o mentor do esquema e distribuiu o "retorno". Mas, não houve o pedido do MPE nesse sentido, no que tange ao enriquecimento ilícito. Por isso, a liminar não o atingiu.
Quanto ao bloqueio de bens dos demais acionados, o magistrado indeferiu. Isso porque ele não viu a probabilidade do direito, um dos requisitos fundamentais para que a liminar do MPE fosse deferida.
Proibição de contratar com o Poder Público
Ainda na decisão, o juiz também negou a solicitação do MPE, que pretendia impedir as empresas alvos do processo de contratarem com o poder público.
Conforme Bruno D’Oliveira, a medida trata-se de penalização, que só é aplicada após o trânsito em julgado, em caso de eventual condenação.
O magistrado destacou também que a proibição, neste momento, “ensejaria na penalização das pessoas jurídicas, as quais, como se sabe, devem, na medida do possível, ser preservadas, pois o ato ilícito é praticado sempre por pessoas físicas, figurando aquelas no processo na condição de beneficiárias do ato”.
O caso
Segundo a denúncia, o Estado assinou um Termo de Compromisso de Conduta em setembro de 2007, para que o governo concluísse o procedimento licitatório até março de 2010, quando estariam expirados os contratos até então vigentes.
Mas, o Estado, em agosto de 2014, publicou ato normativo que invalidou todo o procedimento licitatório que havia sido realizado para regularizar o sistema de transporte coletivo intermunicipal.
Em delação premiada, o ex-governador Silval Barbosa revelou que os empresários do ramo que atuavam na exploração irregular dos serviços, sob a coordenação do Setromat, o subornaram para que o referido ato normativo fosse editado. O ex-gestor contou que, para isso, recebeu R$ 6 milhões.
O ato administrativo acabou sendo derrubado por decisão do Tribunal de Justiça, mas, segundo o MPE, “a manobra criminosa alcançou o êxito no seu propósito, uma vez que conseguiu obstruir a conclusão da licitação do STCRIP, estendeu a operação precária por aproximadamente cinco anos e instalou nova controvérsia sobre o certame que se arrasta até os dias atuais”.
Na delação, Silval também afirmou que o valor da propina foi negociado entre Chico Lima, que na época atuava como procurador do Estado e o Setromat, então presidido por Júlio César Sales Lima.
Ainda de acordo com a denúncia do MPE, na negociação ficou conveniado que o valor da propina seria integralizado parceladamente, cabendo essa responsabilidade ao requerido Éder Augusto Pinheiro, proprietário do Grupo Verde, empresa detentora do maior número de linhas precárias em operação no Estado e com atuação ampla em todas as regiões de Mato Grosso.
Dos R$ 6 milhões, o ex-governador contou que teve conhecimento que Éder Augusto repassou R$ 400 mil para Chico Lima, dos quais R$ 200 mil lhe foi entregue para pagar dívidas políticas e pessoais.
Para o MPE, “as empresas representadas pelo SETROMAT no pedido administrativo dirigido ao Governador do Estado, figurantes no polo passivo desta ação, foram beneficiadas pelo Decreto n.º 2.499, uma vez que a edição do ato supostamente normativo contribuiu para interrupção do processo licitatório em curso, atrasando-o pelo menos cinco anos, período em que mantiveram a exploração precária dos serviços públicos, sonegando impostos, não promovendo investimentos no setor, não pagando outorga pela exploração do serviço e cobrando tarifas extorsivas”.
LEIA ABAIXO A DECISÃO: